Aí está agora teu marido a despejar sacas de dinheiro no regaço de uma amásia, e tu aqui de vestido de chita e chinelas; Tu!… de chinelas!… Foi bom que levasses vida de negra vinte anos para ele agora levar em Lisboa vida de príncipe!
— Não há-de levar, que eu vou lá! — bradou Teodora assanhada pelas reflexões do primo.
— Não vais, prima, que os teus parentes não consentem que tu vás ser em Lisboa motivo de gargalhadas daquela gente, e maltratada por Calisto. A morgada de Travanca, a filha de Francisco Figueiroa, não vai, como as mulherinhas da ralé, procurar o marido fora de sua casa. Se ele vier, veio; se ele ficar, fique embora. Gaste o que quiser, mas que não gaste a casa de sua mulher. Neste país há leis que separam do mau marido a esposa afrontada, e proíbem que os bens dos Figueiroas sejam desbaratados em devassidões de um extravagante.
— Eu não quero separar-me do meu homem! — balbuciou ela afogada de soluços.
— Também te não aconselho a que o faças por enquanto, prima. Ainda é cedo. Pode ser que teu marido caia em si, e se arrependa. Isto da separação é um remédio extremo, que se há-de aplicar no caso de continuarem os saques de dinheiro como até aqui, e os embustes infames com que Calisto te tem enganado. Ai! prima, prima, grande desgraça foi para ti e para mim que te esquecesses do nosso amor de crianças, e tão depressa aceitasses o casamento com este homem! Eu estava a concluir a minha formatura, resolvido a pedir-te, e casar contigo, quer teu pai quisesse, quer não. Nunca to disse; digo-to agora, porque a minha dor me obriga. Não serias tu mais feliz, se casasses com teu primo Lopo?