As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 19: XIX Pág. 129 / 332

Ai, se ele faltasse, o que seria dos pobres! Eu bem sei que o menino há-de fazer o que puder, que tem bom coração; isso tem; mas quem lhe deu as forças dele? Aquele corpo é de ferro. Não faz ideia. Desde pela manhã, até à noite, não tem aquele pobre de Cristo um momento de sossego.

- Ele está cá?

- Está agora a passar pelo sono. E mais tinha um recado com pressa. Foi preciso eu usar de malícia para o fazer descansar. É que esta gente não atende a nada.

- Pois, Joana, eu vinha para agradecer-lhe a visita que ele me fez, mas deixe-o dormir.

- Ele há-de gostar de o ver; que olhe que é muito seu amigo, Danielzinho. Ele tem aqueles modos assim secos, mas... Ainda ontem aqui esteve a dizer que o menino há-de vir a ser coisa grande.

- Não, agora já não cresço mais.

- Ora! bem sabe o que eu quero dizer. Está a rir.

- Eu lhe digo, Joana. Eu que vim meter-me nesta terra, é porque tenho ambições. Lá isso tenho. A si, digo-lhe baixinho, o meu grande desejo é vir a ser...

- O quê? - perguntou Joana, com curiosidade feminina.

- Nada menos que regedor cá na aldeia.

- Ora... fala a sério?

- Pois isso é coisa lá com que se brinque?

- Então para que quer ser regedor?

- E não é uma posição tão bonita?

- Não digo que não. Pois olhe, com o tempo isso não será difícil.

O Sr. João Semana já esteve para o ser; ele é que não quis. Mas o que é, é que o menino está aqui está casado.

- Porque diz isso?

- Ora ! o pai há-de arranjar-lhe noiva rica.

- E então há por cá muito desse género?

- Se há? Boa! Olhe; - aí tem a filha do morgado da Cova do Frade, que é uma moça bonita.

- Ai, muito bonita! Parece mesmo uma dália vermelha.

- Que está a dizer? É uma rapariga escarolada e sadia.

- Lá escarolada será; e então tem muito dinheiro?

- Para cima de vinte mil cruzados.





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