Dir-se-ia que estava vendo nela uma nova Clitemnestra, de conjugicida memória.
- Toma-o tu se gostas - foi a resposta que lhe deu, em tom de voz cheio de amargas exprobações.
- É que me não será preciso para mim - redarguiu a senhora, suspirando.
Este suspiro foi o prelúdio da história dos seus complicados males.
A crónica não foi menos longa, nem menos fértil em episódios, do que a do marido. Os nervos, já se sabe, representavam um papel importantíssimo na série de catástrofes, que a organização da Sr.ª Teresa vira cair sobre si durante os quarenta e nove anos da sua existência.
Daniel foi miraculoso de paciência na atenção que lhe deu; e sublime de sisudez e compostura nos conselhos que, em seguida, recomendou.
O pobre rapaz olhava com saudades para a porta da rua, sem ver probabilidades de a transpor tão cedo.
Enfim, quando julgava haver terminado a sua missão, e tomava jeitos de retirar-se, as seguintes palavras da Sr.ª Teresa vieram apertar-lhe o coração:
- Mas não é tanto por nós que mandámos chamar facultativo.
A doença principal da casa é outra. Aos nossos achaques já nos vamos costumando. Foi por causa da pequena. Quer ter o incómodo de subir?
Daniel não pôde reter um suspiro de impaciência. Se aquelas tinham sido as doenças de segunda ordem, que monstruosa história patológica lhe estava reservada ainda?
Os dois cônjuges fizeram-no subir adiante de si.
Pelas escadas, Daniel, apesar do seu mau humor, não pôde deixar de sorrir, ouvindo a Sr.ª Teresa, a qual fechava o cortejo, dizer para o marido:
- Toma arsénico, João. Ora porque não hás-de tu tomar arsénico?
- Não me digas isso, mulher! - respondia João da Esquina, quase aterrado.
Dentro em pouco, estavam na presença da menina Francisca, filha única deste bem talhado par.