..
- Não sejas tolo, homem! Abre os olhos e vê - exclamou a Sr.ª Teresa, com ar de mistério.
- O quê? - perguntou João da Esquina, não podendo deixar de abrir instintivamente os olhos.
- Que idade tem o Daniel?
- Eu sei lá?
- Vinte e tantos anos, vá. E que idade tem a Chica?
- Ela nasceu logo depois do cerco...
- Faz vinte e um anos para Setembro.
- E daí?
- E daí? E quanto virá a herdar o Daniel por morte do Pai?
- Eu te digo... para cima de trinta mil cruzados, não falando em...
- E ainda perguntas: «E daí?» João da Esquina olhou para a mulher significativamente, e não deu palavra. Tinham-se compreendido os dois.
Passados momentos, murmurou o homem:
- Olha que não era mau, se...
- Vê lá então agora...
- O pior é...
- Pois sim, eu não digo que...
- Mas eles já...? sim...?
- Não, porém...
- Então quem sabe se...
- Isto é... até certo ponto...
- É verdade que também...
- Sim, pois está claro, e...
- E mau era que já...
- Com certeza... demais...
- Agora o que é preciso, é...
- Isso com o tempo... bem vês que...
Não sei se o leitor penetrou bem o sentido deste diálogo, cortado de expressivas reticências e ao qual falta, para o interpretar, a eloquência do olhar e de gestos, que os dois cônjuges trocavam entre si. É certo que eles se compreenderam assim, e largas horas ficaram discutindo os teres e haveres de Daniel, e as probabilidades e vantagens de uma união entre a casa dos Esquinas e a dos Dornas, as quais, com os anos, podiam fornecer sofríveis elementos para a confecção de um brasão heráldico.
A Sr.ª Teresa foi encarregada por o marido de excitar na menina o ardor pela conquista e industriada em dirigir o negócio de maneira a «prender o melro por a asa» - foi a frase imaginosa, da qual João da Esquina se serviu.