Reitor e todos, os que nisso reparam?
- Bem vês, Clarinha, que não é de ti que eu receio. Conheço-te.
Mas, tu bem sabes, o Sr. Daniel é... dizem dele... passa por...
E Margarida hesitava, ao procurar exprimir a opinião pública a respeito de Daniel, porque todas as frases lhe pareciam demasiadamente duras e severas para o carácter dele.
- Nem sei o que me parece ouvir-te dizer isso. Ainda que ele fosse o que por aí dizem, conserve-se uma pessoa no seu lugar, que nada pode temer. Querias talvez que eu fizesse como aquela gente, no outro dia, na esfolhada, que toda se encolhia quando ele chegou?
- Na esfolhada? - disse Margarida, ainda sem olhar para a irmã. - E tu que ainda me não contaste nada do que se passou lá nessa noite!
Esta alusão embaraçou manifestamente Clara, que se apressou a dizer, como se a não tivesse ouvido:
- E demais, não tens tu escutado todas, ou quase todas as conversas do Sr. Daniel comigo? Aí tens estado por dentro da janela e sem que ele o saiba. De que o ouves falar? Diz-me alguma coisa que eu não deva ouvir? Conta-me o que viu na cidade, o que leu, histórias, versos... - e como conta bem! - e queres que eu não me entretenha a ouvi-lo, quando tu mesma, às vezes, sim que eu bem tenho reparado, deixas de trabalhar e ficas quieta a escutá-lo também!
Então que há nisto de mal?
- Mas então? Já se fala... Que se lhe há-de fazer? O mundo tem maldades e nós vivemos no mundo... Há gente de tão más tenções, que, só pelo gosto de fazer mal, pode ir às vezes inquietar o espírito de Pedro com histórias mentirosas, e daí sabe Deus...
O ruído de um cavalo a trote, que vinha do lado dos montes, interrompeu o diálogo. Clara dirigiu para lá os olhos e viu um cavaleiro que se aproximava, saudando-a de longe.