As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 10: X Pág. 62 / 332

Era mais uma afeição que lhe roubavam! Pois nem esta lhe pertencia? E depois, como seria considerada pelo marido de Clara?

Humilhações, pudera-as suportar de sua madrasta, mas receava não ter já resignação bastante para as receber de mais ninguém.

É certo que o bom nome de Pedro a tranquilizava; mas quantas decepções sobre os melhores caracteres humanos, nos prepara uma íntima convivência com eles? - quantos defeitos ocultos, ignorados do mundo, a vida de família faz evidentes, a ponto de tornar inevitáveis discórdias, que aos olhos do vulgo nunca se justificam?

A corrente destes pensamentos tomou porém, de uma maneira gradual, diverso curso. O nome da família de Pedro não era desconhecido para Margarida.

Andava-lhe associada a mais grata recordação da amargurada infância da órfã. Quem em tão pequeno número contava os corações que haviam simpatizado com o seu, que muito era se recordasse com saudade do pequeno estudante de latim que, de tão longe, vinha sentar-se ao pé dela e falar-lhe com um afecto que até então desconhecera?

Desde que as apreensões do reitor haviam ocasionado a partida de Daniel, nunca mais Margarida lhe falara. Via-o todos os anos, quando ele vinha passar as férias à aldeia, e não podia ocultar a si própria a afectuosa atenção com que ainda então o observava.

Mas, pelos seus novos hábitos de vida, Daniel distanciara-se daquela que conhecera em criança; nem dela talvez se lembrasse já. Margarida pensava agora no caso, que os aproximava assim, e não podia, sem uma vaga inquietação de espírito, ver, no futuro, a possibilidade de uma entrevista com ele.

Os caracteres concentrados, como o de Margarida, alimentam- -se ordinariamente de uma ideia fixa... - quantas vezes de uma ilusão? - que forma o segredo inviolável da sua existência inteira.





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