O Conde de Monte Cristo - Cap. 52: Toxicologia Pág. 514 / 1080

Então levava a couve para casa, pegava num coelho - o abade Adelmonte tinha uma colecção de coelhos, gatos, e porquinhos-da-índia que nada ficavam a dever à sua colecção de legumes, flores e frutos -, o abade Adelmonte pegava então num coelho, dava-lhe a comer uma folha de couve e o coelho morria. Que juiz de instrução ousaria insurgir-se contra isto e que procurador régio se lembraria alguma vez de proceder judicialmente contra o Sr. Magendie ou o Sr. Flourens por causa dos coelhos, dos porquinhos-da-índia e dos gatos que têm matado? Nenhum. Temos portanto um coelho morto sem que a justiça se incomode com isso. Morto o coelho, o abade Adelmonte manda-o esvaziar pela sua cozinheira e atira as vísceras para uma estrumeira. Na estrumeira há uma galinha, que debica as vísceras do coelho, adoece por seu turno e morre no dia seguinte. No momento em que ela se debate nas convulsões da agonia, passa um abutre (há muitos abutres na terra de Adelmonte), que desce sobre o cadáver, leva-o para um rochedo e come-o. Três dias mais tarde, o pobre abutre, que desde essa refeição andou constantemente indisposto, sente uma vertigem na altura em que voa muito alto. Rola no vácuo e vem cair pesadamente no seu viveiro, minha senhora. O lúcio, a enguia e a moreia são insaciáveis, como sabe, e mordem o abutre. Bom, suponha agora que no dia seguinte servem à sua mesa essa enguia, esse lúcio ou essa moreia, envenenados em quarto lugar, e que o seu conviva e envenenado em quinto e morre ao fim de oito ou dez dias de dores de barriga, de náuseas, de tumores no piloro. Far-se-á a autópsia e os médicos dirão: «O paciente morreu de um tumor no fígado ou de uma febre tifóide.»

- Mas todas essas circunstâncias que o senhor encadeia umas nas outras podem ser interrompidas pelo mais pequeno acidente - observou a Sr.ª de Villefort. - O abutre pode não passar a tempo ou cair a cem passos do viveiro.

- Ora é precisamente aí que reside a arte! Para se ser um grande químico no Oriente é necessário dirigir o acaso. E isso consegue-se.

A Sr.ª de Villefort escutava, pensativa.

- Mas - disse ela - o arsénico é indelével. Seja qual for a forma como se absorva, encontrar-se-á no corpo do homem desde o momento que tenha sido tomado em quantidade suficiente para causar a morte.

- Exacto, exacto! - exclamou Monte-Cristo. - é precisamente o que diz o bom Adelmonte! Reflectiu, sorriu e respondeu-me através de um provérbio siciliano, que me parece ser também um provérbio francês: "Meu filho, o mundo não foi feito num dia, mas sim em sete; volte no domingo."





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069