Mas os seus olhos não largavam o camarote entre colunas, que durante o primeiro acto pareceu obstinar-se em permanecer fechado.
- Por fim, quando Albert consultava pela centésima vez o relógio, no início do segundo acto, a porta do camarote abriu-se e Monte-Cristo, vestido de preto, entrou e encostou-se à balaustrada para olhar a sala. Morrel, que o acompanhava, pôs-se também a procurar com os olhos a irmã e o cunhado. Descobriu-os num camarote de segunda ordem e fez-lhes sinal.
Ao dar uma vista de olhos circular pela sala, o conde descobriu uma cara pálida e olhos cintilantes que pareciam querer atrair avidamente os seus. Reconheceu Albert, mas a expressão que notou naquele rosto transtornado aconselhou-o sem dúvida a fazer de conta que o não vira. Sem esboçar portanto nenhum gesto que revelasse o seu pensamento, sentou-se, tirou o binóculo do estojo e apontou-o para outro lado.
Mas, sem parecer ver Albert, o conde não o perdia de vista, e quando o pano desceu, no fim do segundo acto, o seu golpe de vista infalível e seguro seguiu o jovem, que saia da plateia acompanhado dos seus dois amigos.
Depois, a mesma cara reapareceu num camarote de primeira ordem, defronte do seu. O conde sentia aproximar-se a tempestade, e quando ouviu a chave girar na fechadura do seu camarote, embora falasse nesse momento com Morrel com o seu rosto mais risonho, o conde sabia a que se a ter e estava preparado para tudo.
A porta abriu-se.
Só então Monte-Cristo se virou e viu Albert, lívido e trémulo, e atrás dele Beauchamp e Château-Renaud.
- Ora vejam, o meu cavaleiro sempre conseguiu cá chegar! - exclamou com a benevolente delicadeza que distinguia habitualmente a sua saudação das vulgares cortesias da sociedade. - Boas noites, Sr. de Morcerf.
E o rosto daquele homem, tão singularmente senhor de si mesmo, exprimia a mais perfeita cordialidade.
Morrel lembrou-se da carta que recebera do visconde e na qual, sem outra explicação, este lhe pedia que fosse à ópera, e adivinhou que ia acontecer algo terrível.
- Não vimos aqui para trocar cumprimentos hipócritas ou manter aparências enganosas de amizade - redarguiu o jovem. - Vimos pedir-lhe uma explicação, Sr. Conde.
A voz trémula do jovem passava-lhe a custo por entre os dentes cerrados.
- Uma explicação na ópera? - observou o conde, no tom tão calmo e num relance de olhos tão penetrante, só característicos do homem eternamente senhor de si mesmo. - Apesar de pouco familiarizado com os hábitos parisienses, nunca imaginei, senhor, que fosse aqui que as explicações se pedissem.