O Conde de Monte Cristo - Cap. 59: O testamento Pág. 574 / 1080

O Sr. Noirtier, privado da voz, privado de movimento, fecha os olhos quando quer dizer sim e pestaneja várias vezes quando quer dizer não. Sabe agora, senhor, o suficiente para falar com o Sr. Noirtier. Experimente.

O olhar que o velho deitou a Valentine estava tão húmido de ternura e reconhecimento que o próprio notário o compreendeu.

- Ouviu e compreendeu o que acaba de dizer a sua neta, senhor? - perguntou o notário.

Noirtier fechou suavemente os olhos e abriu-os um instante depois.

- E aprova o que ela disse, isto é, que os sinais indicados por ela são de facto aqueles com o auxílio dos quais o senhor faz compreender o seu pensamento?

- Aprovo - respondeu novamente o velho.

- Foi o senhor que me mandou chamar?

- Fui.

- Para fazer o seu testamento?

- Sim.

- E não quer que me retire sem ter feito esse testamento?

O paralítico pestanejou vivamente e por diversas vezes.

- Então, senhor, compreende agora e a sua consciência já está tranquila? - perguntou a jovem.

Mas antes de o notário ter tempo de responder, Villefort puxou-o à parte.

- Senhor, parece-lhe que um homem possa suportar impunemente um abalo físico tão terrível como o que experimentou o Sr. Noirtier de Villefort sem que o próprio moral tenha sido gravemente atingido?

- Isso não é precisamente o que me inquieta, senhor respondeu o notário.

- O que pergunto a mim mesmo é como conseguiremos adivinhar-lhe os pensamentos, a fim de lhe provocar as respostas.

- Bem vê que é impossível - insistiu Villefort.

Valentine e o velho ouviam esta conversa. Noirtier pousou um olhar tão fixo e tão firme em Valentine que esta compreendeu que tal olhar exigia evidentemente uma resposta.

- Senhor - interveio -, não se preocupe com isso. Por mais difícil que seja, ou antes, que lhe pareça descobrir o pensamento do meu avô, revelar-lho-ei de forma a desfazer todas as dúvidas a esse respeito. Há seis anos que convivo de perto com o Sr. Noirtier e ele próprio que diga se, nesses seis anos, um só dos seus desejos ficou sepultado no seu coração por não conseguir dar-mo a entender.

- Não - respondeu o velho.

- Experimentemos então - disse o notário. - Aceita esta menina como a sua intérprete? O paralítico fez sinal que sim.

- Muito bem. Vejamos então, senhor, que deseja de mim, qual é o acto que pretende praticar...

Valentine recitou todas as letras do alfabeto até à letra T

Uma eloquente olhadela de Noirtier deteve-a nessa altura.

- O senhor pede a letra T - disse o notário. - A escolha é visível.

- Espere - pediu Valentine, que em seguida se virou para o avô e recitou: - Ta... te...





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069