O Conde de Monte Cristo - Cap. 61: Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos Pág. 589 / 1080

Aliás, a humidade artificial substituiria rapidamente a humidade natural, se fosse preciso, graças ao casco cheio de água estagnada que escavava um dos cantos do jardim e no qual estacionavam, numa toalha verde, uma rã e um sapo, que, por incompatibilidade de humor, sem dúvida, se conservavam sempre, de costas um para o outro, nos dois pontos opostos do círculo. Além disso, nem uma erva nas alamedas, nem um rebento parasitanas guarnições dos canteiros. Uma elegante pretensiosa arranjaria e podaria com menos cuidado os gerânios, os cactos e os rododendros da sua jardineira de porcelana do que o dono até então invisível do pequeno recinto.

Monte-Cristo parou depois de fechar a porta prendendo o cordel no prego e abarcou num olhar toda a propriedade.

«Parece que o homem do telégrafo tem jardineiros contratados ao ano ou então que se dedica apaixonadamente à jardinagem», disse para consigo.

De súbito, esbarrou com qualquer coisa agachada atrás de um carrinho de mão carregado de folhas. Essa qualquer coisa endireitou-se, deixou escapar uma exclamação que denotava a sua surpresa e Monte-Cristo encontrou-se diante de um homenzinho dos seus cinquenta anos que apanhava morangos que colocava em cima de folhas de videira.

Ao levantar-se, o pobre homem quase deixou cair morangos, folhas e prato.

- Está a fazer a sua colheita, senhor? – perguntou Monte-Cristo, sorrindo.

- Perdão, senhor - respondeu o homenzinho, levando a mão ao boné -, não estou lá em cima, é certo, mas acabo de descer neste preciso instante.

- Não quero incomodá-lo em nada, meu amigo - tranquilizou-o o conde. - Apanhe os seus morangos à vontade, se ainda não acabou.

- Faltam-me dez - disse o homem. - Estão aqui onze e ao todo são vinte e um, mais cinco do que o ano passado. Mas não admira, este ano a Primavera foi quente e os morangos precisam de calor. Aí está porque, em vez dos dezasseis que tive o ano passado, este ano tenho, como vê, onze já colhidos... doze, treze, catorze, quinze, dezasseis, dezassete, dezoito, dezanove... Oh, meu Deus, faltam-me dois! E ainda cá estavam ontem, senhor; estavam, tenho a certeza, porque os contei. Oxalá não tenha sido o filho da Tia Simon que mos roubou; vi-o a rondar por aqui esta manhã... Grande patife, roubar num recinto fechado! Bem se vê que não sabe onde isso o pode levar.

- De facto - concordou Monte-Cristo - o caso é grave, mas o senhor terá em conta a juventude do delinquente e a sua gulodice.

- Claro - respondeu o jardineiro. - Mas mesmo assim, o caso não deixa de ser muito desagradável. Oh, mais uma vez perdão, senhor? É talvez um chefe que faço esperar assim?...

E interrogava com um olhar receoso o conde e a sua sobrecasaca azul.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069