O Conde de Monte Cristo - Cap. 13: Os Cem Dias Pág. 90 / 1080

Numa reviravolta muito natural, o digno armador que dissemos pertencer ao Partido Popular encontrou-se por sua vez nesse momento, não diremos todo-poderoso, porque o Sr. Morrel era homem prudente e um bocadinho tímido, com todos aqueles que acumularam uma lenta e laboriosa fortuna comercial, mas em condições, por mais excedido que fosse pelos zelosos bonapartistas que o apodavam de moderado, em condições, dizia, de erguer a voz para fazer ouvir uma reclamação. Essa reclamação, como facilmente se adivinha, referia-se a Dantès.

Villefort ficara de pé apesar da queda do seu superior, e o seu casamento, embora continuasse decidido, fora no entanto adiado para tempos mais propícios. Se o imperador conservasse o trono, glérard precisaria doutra aliança, e o pai encarregar-se-ia de lha arranjar; se segunda restauração reconduzisse Luís XVIII aFrança, a influência do Sr. de Saint-Méran duplicaria, assim como a dele, e a união tornava-se mais vantajosa do que nunca.

O substituto do procurador régio era portanto momentaneamente o primeiro magistrado de Marselha quando uma manhã a sua porta se abriu e lhe anunciaram o Sr. Morrel.

Qualquer outro apressar-se-ia a ir ao encontro do armador e com essa solicitude deixaria transparecer a sua fraqueza. Mas Villefort era um homem superior que possuía, senão a prática, pelo menos o instinto de todas as coisas. Mandou-o, pois, esperar na antecâmara, como faria no tempo da Restauração, embora não estivesse a atender ninguém, mas pela simples razão de que era hábito um substituto do procurador régio fazer esperar na antecâmara. Depois, passado um quarto de hora, que empregou a ler dois ou três jornais de tendências diferentes, mandou introduzir o armador.

O Sr. Morrel esperava encontrar Villefort abatido; encontrou-o como o encontrara seis semanas antes, isto é, calmo, firme e cheio de fria polidez, a mais intransponível de todas as barreiras que separam o homem educado do homem vulgar.

Entrara no gabinete de Villefort convencido de que o magistrado tremia ao vê-lo, e era ele, muito pelo contrário, que se encontrava trémulo e impressionado diante daquela personagem interrogadora que o esperava com o cotovelo apoiado na secretária.

Parou à porta. Villefort olhou-o como se tivesse certa dificuldade em o reconhecer. Por fim, depois de alguns segundos de exame e silêncio, durante os quais o digno armador virou e revirou o chapéu nas mãos, Villefort disse:

- O Sr. Morrel, creio?

- Sim, senhor, eu próprio - respondeu o armador.

- Aproxime-se - continuou o magistrado, fazendo com a mão um gesto protector - e diga-me a que circunstância devo a honra da sua visita.

- Não adivinha, senhor? - perguntou Morrel.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069