A Queda de um Anjo - Cap. 21: Capítulo 21 Pág. 116 / 207

Estas explicações não evitaram que o desembargador, com os seus velhos amigos, prognosticasse o derrancamento do morgado da Agra, depois que ele se retirou, algum tanto azedado das reflexões daquela gente encanecida.

Sarmento não o convidara a ir visitar as filhas a Campolide, nem de leve, no correr da noite, falou delas. Calisto Elói também não suscitou conversação relativa às senhoras, porque já a doblez do espírito lhe tolhia a usual franqueza e familiaridade.

Entrou a dementar-se aquela desconcertada cabeça. A saudade, em vez de lhe tirar lágrimas do íntimo, amadurou-lhe temporãmente a apostema de sandices, que em todo o homem se cria paredes-meias com o coração. Aí começa ele a imaginar que o desembargador Sarmento, adivinhando os amores mal recatados de Adelaide, a obrigara a sair de Lisboa. Corroborava a suspeita não o convidar ele a visitar as damas. Isto sobreexcitou-lhe o sentimento; porque, a seu ver, Adelaide estava penando, havia uma vítima, um coração sopesado, uma alma em abafos de paixão.

Esta conjectura atirou com Calisto para os tempos cavaleirosos.

O olhar em si, e ver-se manietado pelos vínculos sacramentais, não o reduzia à compostura e honestidade de seu estado e anos. Ainda assim, sejamos justiceiros e ao mesmo tempo misericordiosos com esta alma enferma; na cabeça alucinada de Calisto de Barbuda não havia ideia ignóbil e impudica.

O amor, explodindo da cratera abafada quarenta e quatro anos, dizia-lhe que era fidalguia de alma não transigir, por conveniências e respeitos sociais, com a opressão e alvedrio paterno.





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