A Queda de um Anjo - Cap. 12: Capítulo 12 Pág. 63 / 207

Numa das seguintes noites, foi Calisto ao chá do desembargador Sarmento. Achou mais abatido e melancólico o antigo magistrado. Estiveram conversando à puridade sobre o desgosto que revia a face do hospedeiro ancião. Crê-se que Sarmento lhe dissera que sua filha Catarina, depois de haver casado por paixão, com cedo se desaviera da vontade do marido, e este da estima dela; de modo que raro dia deixavam de alterar e renhir por motivos insignificantes. Disto resultava a tristeza constante do velho, acrescentada agora com ter-lhe dito alguém que sua filha andava infamada pela voz pública.

— Ferro penetrante — exclamou o desembargador — que me traspassou este corpo já fraco e pendido à campa.

Calisto apertou-o nos braços e clamou:

— Amigo e senhor meu! A desgraça não derrete o aço dos peitos fortes. Tenha-se V. Exa. arrimado ao bordão de sua honra, que não hão-de adversidades derribá-lo. Aqui me ponho de seu lado, com a fortaleza da amizade, para, como filho de V. Exa. e irmão da Sra. D. Catarina, minha senhora, tirar a limpo da sujidade da calúnia, se o é, a virtude dela, e o contentamento de V. Exa.. Aqui vem de molde o repetir as palavras afectivas do meu dilecto Heitor Pinto, no tratado da Tribulação: «O que eu queria é que a boceta de vossas angústias estivesse depositada em minhas entranhas, e que os meus bens fossem vossos, e os vossos males fossem meus.»





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