Os Brilhantes do Brasileiro - Cap. 13: XIII – Desamparo Pág. 65 / 174

O estudante abandonou as aulas. Quem o sustentaria? Como congraçar o estudo com qualquer outro emprego? E qual emprego lhe daria pão, exauridos os cobres salvados dos últimos vestidos feitos por sua irmã?

Joana pediu trabalho a uma modista francesa. Exigiram-lhe fiança. Ela disse a chorar que não conhecia ninguém. Abonaram-na as lágrimas. Permitiu a modista que a desvalida levasse as fazendas para um sótão da Rua Escura, onde seu irmão tinha vivido como estudante de escassos recursos. Francisco vendeu todos os seus livros, depois que apartou de entre eles as Esperanças de Ângela. Comprou com o produto deles a catre de sua irmã, que dormia sobre tábuas. Dizia ela que para quem passava as noites trabalhando e chorando todo o leito era bom.

Os condiscípulos do académico, sabedores do infortúnio do primeiranista, quotizaram-se para lhe acudir e salvar o ano: Francisco rejeitou a esmola sem orgulho, dizendo: “Quem não pode ser médico, seja operário de mais humilde condição”.

Um dia ofereceram-lhe o lugar de amanuense de tabelião. Aceitou muito agradecido. Escrevia à rasa, e ganhava trezentos réis diários. No sótão da Rua Escura, depois de dois meses de trabalho incessante, com intermitências de lágrimas, havia horas regulares de comer.

Eis aqui o poeta dos SONHOS, três meses depois que... sonhava. Que despertar aquele! Se não vale mais andar um homem sempre acordado, e a patinhar na lama deste planeta para não adormecer!...

Entretanto, Ângela de Noronha, ou d’Antas, como as tias a apelidavam para sacudirem de si o opróbrio de tal parenta, ainda lia os SONHOS do cismador do monte d’Agra e das ribas do mar. O manuscrito e cartas de Francisco andavam na caixa de Vitorina, valendo todavia menos às amarguras de Ângela do que o oiro da velha, o qual (digamo-lo com vénia da poesia, e da prosa apocalíptica) tornava muitíssimo mais prestimosa a caixa da generosa criada.





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