XXVIII - Confidências do cego Batia alvoroçado o coração de Ângela quando ao longe tilintava a guisalhada da liteira, em que entrava nas Boticas o conde de Gondar. Joana e Vitorina, pasmadas da casualidade, faziam considerações muito religiosas sobre o caso.
Francisco saíra à extrema da aldeia para guiar o liteireiro. O cego, sabendo que o doutor o viera esperar, mandou parar o veículo, para apertar a mão do “segundo criador da sua luz”, dizia ele.
Caminhou Costa de par com a portinhola, e tomou o velho nos braços, quando a liteira parou ao portão do quinteiro.
Ângela e as outras espreitavam das janelas. Vitorina benzia-se, murmurando:
- Ai! Como ele está acabadinho! Quem viu este senhor há quarenta anos!
Ângela retraiu-se da janela para limpar as lágrimas.
Subiu o conde pelo braço de Francisco os poucos degraus que levavam do quinteiro à saleta destinada.
A melhor alfaia de assento era uma preguiceira almofadada a toda a presa por Ângela e Joana com um colchãozinho de lã e chita escarlate, e dois travesseiros com suas fronhas de folhos engomados.
- Queira vossa excelência sentar-se, e reclinar-se, senhor conde - disse o facultativo. - Convir-lhe-ia melhor uma poltrona; mas não a tenho.
- Isto é magnífico! - disse o general. Encostando-se confortavelmente. - que ar de frescura tem esta casa! Parece que a felicidade tem um aroma particular, primo Pizarro! - ajuntava o general voltado para onde se lhe figurava estar o fidalgo de Chaves. - Onde vossa excelência me trouxe!... Como isto me há de parecer o céu, quando eu puder ver a casa e os bem-aventurados que vivem nela!... Ainda me não deu a honra de me apresentar a sua senhora, a seu filhinho e a sua irmã, senhor Costa.
- Eu chamo-os: são os criados de vossa excelência que eu apresento.