O Conde de Monte Cristo - Cap. 110: O libelo acusatório Pág. 1018 / 1080

»Depois, julgando que o que fora enterrado fosse algum tesouro, abriu a cova e encontrou-me ainda vivo. Esse homem levou-me para o Albergue das Crianças Abandonadas, onde me inscreveram sob o número 57. Três meses depois a irmã do meu salvador veio de Rogliano a Paris procurar-me, reclamou-me como seu filho e levou-me. Aqui está como, apesar de nascido em Auteuil, fui criado na Córsega.

Houve um instante de silêncio, mas de um silêncio tão profundo que, sem a ansiedade que pareciam respirar mil peitos, julgar-se-ia a sala vazia.

- Continue - disse a voz do presidente.

- Claro - prosseguiu Benedetto - que poderia ter sido feliz em casa dessa boa gente, que me adorava. Mas a minha natural perversidade levou a melhor sobre todas as virtudes que a minha mãe adoptiva tentou incutir-me. Cresci no mal e cheguei ao crime. Por fim, num dia em que amaldiçoava Deus por me ter feito tão mau e ter-me dado destino tão horrível, o meu pai adoptivo disse-me: «Não blasfemes, desgraçado, pois Deus deu-te a vida sem cólera! O crime vem do teu pai e não de ti; do teu pai que te votou ao Inferno, se morresses, e à miséria, se um milagre te restituísse à vida!» Desde então deixei de blasfemar contra Deus e amaldiçoei o meu pai. Por isso proferi aqui as palavras que me censurou, Sr. Presidente; por isso causei o escândalo que ainda faz tremer esta assembleia. Se se trata de mais um crime, punam-me por ele; mas se estão convencidos, se consegui convencê-los de que desde o dia do meu nascimento o meu destino era fatal, doloroso, amargo, lamentável, compadeçam-se de mim!

- Mas a sua mãe? - perguntou o presidente.

- A minha mãe julgava-me morto; a minha mãe não é de modo algum culpada. Não procurei saber o nome da minha mãe; não a conheço.

Neste momento soou um grito agudo, que terminou num soluço, no meio do grupo que rodeava, como já dissemos, uma mulher.

Essa mulher teve um violento ataque de nervos e foi levada do pretório. Enquanto a levavam, o véu espesso que lhe cobria o rosto afastou-se e reconheceu-se a Sr.ª Danglars.

Apesar do acabrunhamento, dos seus sentidos embotados e do zumbido que lhe vibrava aos ouvidos; apesar da espécie de loucura que lhe perturbava o cérebro, Villefort reconheceu-a elevantou-se.

- As provas! As provas! - exigiu o presidente. - Lembre-se o réu de que essa teia de horrores precisa de ser comprovada por provas esmagadoras.

- As provas? - redarguiu Benedetto, rindo. - Quer provas?...

- Quero.

- Então olhe para o Sr. de Villefort e depois diga-me se ainda quer que lhe dê provas.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069