- Oh! - gritou, como se um ferro em brasa lhe atravessasse o coração.
Com efeito, havia uma hora que só tinha diante dos olhos um aspecto da sua miséria, mas eis que de repente se lhe apresentava outra ao espírito, e uma outra não menos terrível.
Armara em juiz inexorável com a mulher e condenara-a à morte; e ela, cheia de terror, consumida pelos remorsos, mergulhada na infâmia que ele lhe fizera sentir com a eloquência da sua impecável virtude; ela, pobre mulher fraca e indefesa contra um poder absoluto e supremo, preparava-se talvez naquele momento para morrer!
Decorrera uma hora desde a sua condenação. Sem dúvida, naquele momento a mulher repassava na memória todos os seus crimes, pedia perdão a Deus, escrevia uma carta a implorar de joelhos o perdão do seu virtuoso marido, perdão que comprava com a sua morte...
Villefort soltou um novo grito de dor e de raiva.
- Oh, aquela mulher só se tornou criminosa porque casou comigo! - exclamou, agitando-se no cetim da carruagem. - Resumo crime e ela apanhou o crime como se apanha o tifo, como se apanha a cólera, como se apanha a peste!... E eu castiguei-a!... Ousei dizer-lhe: «Arrepende-te e morre...» Eu! Oh, não, não! Ela viverá... seguir-me-á... Vamos fugir, deixara França, seguir em frente até onde a Terra nos possa levar.
»Falei-lhe de cadafalso!... Grande Deus, como ousei pronunciar tal palavra? Mas o cadafalso também me espera a mim!...
»Fugiremos... Sim, confessar-me-ei a ela! Sim, dir-lhe-ei todos os dias, humilhando-me, que também cometi um crime... Oh, a aliança do tigre com a serpente! Oh, digna mulher de um marido como eu!... É necessário que ela viva, que a minha infâmia empalideça a sua!
E Villefort partiu, em vez de descer o vidro da frente do cupé.
- Depressa, mais depressa! - gritou numa voz que fez saltar o cocheiro no assento.
Levados pelo medo, os cavalos voaram até casa.
- Sim, sim - repetia Villefort à medida que se aproximava de casa -, é necessário que essa mulher viva, que se arrependa, que crie o meu filho, o meu pobre filho, o único, juntamente com o indestrutível velho, que sobreviveu à destruição da família! Ela ama-o; foi por ele que fez tudo.
»Nunca se deve desesperar do coração de uma mãe que ama o filho. Arrepender-se-á, ninguém saberá que é culpada. Os crimes cometidos em minha casa, e de que a sociedade já murmura, depressa serão esquecidos com o tempo. E se algum inimigo se lembrar deles... bom, incluí-lo-ei na minha lista de crimes.
»Um, dois ou três crimes mais que importa! A minha mulher salvar-se-á e fugirá com o ouro, e sobretudo com o filho, para longe do abismo em que me parece que o mundo vai cair comigo.