Morrel olhou o conde com espanto.
- Conde, o senhor já não é o mesmo que era em Paris.
- Como assim?
- É verdade. Aqui, o senhor ri.
A fronte de Monte-Cristo nublou-se de súbito.
- Fez bem em me chamar a atenção para isso, Maximilien. Tornara vê-lo foi uma felicidade Para mim e esqueci-me de que toda a felicidade é passageira.
- Oh, não, não, conde! - exclamou Morrel, pegando de novo nas mãos do amigo. - Pelo contrário, ria, seja feliz, e prove-me com a sua despreocupação que a vida só é má para aqueles que sofrem. O senhor é caridoso, é bom, é grande, meu amigo, e é para me dar coragem que simula essa alegria.
- Engana-se, Morrel; de facto, sentia-me feliz.
- Então, foi porque se esqueceu de mim Tanto melhor!
- Como assim?
- Claro! Como dizia o gladiador ao entrar no circo, dirigindo-se ao sublime imperador, também eu lhe digo, meu amigo: «Aquele que vai morrer saúda-te.»
- Não está conformado? - perguntou Monte-Cristo, com um olhar estranho.
- Oh! - exclamou Morrel com um olhar cheio de amargura. - Acreditou realmente que isso fosse possível?
- Ouça - disse o conde. - Compreende bem as minhas palavras, não é verdade, Maximilien? Não me considera um homem vulgar, uma cegarrega que emite sons vagos e vazios de sentido. Quando lhe pergunto se está conformado, falo-lhe como um homem para quem o coração humano já não tem segredos. Pois bem, Morrel, desçamos ambos ao fundo do seu coração e sondemo-lo. Sente ainda essa impaciência ardente e dolorosa que faz saltar o corpo como salta o leão picado pelo mosquito? Continua a experimentar essa sede devoradora que só se extingue na sepultura? Domina-o essa fantasia da saudade que lança o vivo fora da vida em busca da morte? Ou trata-se apenas de prostração, de coragem esgotada, de contrariedade que sufoca o raio de esperança que procura brilhar? Ou da perda da memória que leva à impotência das lágrimas? Oh, meu caro amigo, se é isso, se já não pode chorar, se julga morto o seu coração embotado, se já só tem confiança em Deus, olhares apenas para o céu, então, amigo, ponhamos de parte as palavras, demasiado inexpressivas para o sentido que lhes dá a nossa alma! Maximilien, você está conformado, já não se lamenta.
- Conde - respondeu Morrel, na sua voz suave e firme ao mesmo tempo. - Conde, ouça-me como se ouve um homem que fala de dedo estendido para a terra e olhos erguidos para o céu: vim ter consigo para morrer nos braços de um amigo. Claro que existem pessoas que amo: amo a minha irmã Julie, amo o seu marido, Emmanuel; mas necessito que se me abram braços fortes e que me sorriam nos meus derradeiros instantes.