»Mas esperar é impossível! Morro de fome; dentro de poucas horas as fracas energias que me restam terão desaparecido. De resto, a hora da visita aproxima-se. O alarme ainda não foi dado talvez por não desconfiarem de nada. Posso fazer-me passar por um dos tripulantes do barquito que naufragou esta noite. A história não deixará de ter a sua verossimilhança. Ninguém virá contradizer-me, pois afogaram-se todos. Vamos.
Depois destas palavras, Dantès olhou para o local onde o barquito naufragara e estremeceu. O barrete frígio de um dos náufragos ficara preso na aresta de um rochedo e pertíssimo dali flutuavam alguns destroços da quilha, traves inertes que o mar impelia contra a base da ilha, onde batiam como impotentes aríetes.
Dantès decidiu-se num instante. Deitou-se ao mar, nadou para o barrete, pô-lo na cabeça, agarrou numa das traves e nadou de forma a cortar a linha de rumo que devia seguir o navio.
- Agora, estou salvo - murmurou.
E esta convicção deu-lhe forças.
Não tardou a ver a tartana que, com o vento quase de proa, bolinava entre o Castelo de If e a torre de Planier. Por instantes, Dantès receou que, em vez de passar perto da costa, o naviozinho ganhasse ao largo, como faria se, por exemplo, o seu destino fosse a Córsega ou a Sardenha. Mas da forma que manobrava o nadador não tardou a descobrir que desejava passar, como era hábito dos navios que demandavam a Itália, entre a ilha de Jaros e a ilha de Calaseraigne.
Entretanto, o navio e o nadador aproximavam-se insensivelmente um do outro. Numa das suas bordadas, a embarcação aproximou-se mesmo cerca de um quarto de légua de Dantès. Este ergueu-se então na água e agitou o barrete em sinal de quem pede socorro. Mas ninguém o viu do navio, que virou de bordo e recomeçou a bolinar. Dantès pensou em chamar, mas calculou a olho a distância e compreendeu que a sua voz não chegaria ao navio: primeiro seria levada e abafada pela brisa do mar e pelo ruído das ondas.
Foi então que se felicitou pela precaução que tomara de se estender numa trave. Enfraquecido como estava, talvez não conseguisse aguentar-se à tona de água até alcançar a tartana. E, com toda a certeza, se a tartana, o que era possível, passasse sem o ver, não teria forças para regressar à costa.
Embora estivesse mais ou menos certo da rota que seguia o navio, Dantès acompanhou-o com a vista com certa ansiedade até ao momento em que o viu mudar, de rumo e dirigir-se ao seu encontro.
Então, lançou-se também ao encontro do navio. Mas antes de se alcançarem mutuamente, a embarcação começou a virar de bordo.