O Conde de Monte Cristo - Cap. 22: Os contrabandistas Pág. 182 / 1080

O novo carregamento destinava-se ao ducado de Luca e compunha-se quase inteiramente de charutos de Havana e vinho de Xerez e de Málaga.

Mas aí surgiram complicações com os «pica-chouriços», os eternos inimigos do patrão da Jeune-Amélie. Um guarda caiu morto e dois marinheiros ficaram feridos. Dantès foi um desses marinheiros; uma bala atravessou-lhe a carne do ombro esquerdo.

Dantès ficara quase feliz com a escaramuça e quase contente com a ferida. Ambas lhe tinham ensinado, essas severas professoras, com que olhos devia encarar o perigo e com que ânimo suportar o sofrimento. Enfrentara o perigo rindo e ao ser ferido dissera como o filósofo grego: «Dor, não és um mal.»

Além disso, examinara o guarda ferido de morte e, quer pelo calor do sangue na acção, quer por arrefecimento dos sentimentos humanos, a vista do corpo causara-lhe apenas uma ligeira impressão. Dantès encontrava-se no caminho que queria percorrer e dirigia-se para o objectivo que pretendia atingir. O coração estava em vias de se lhe petrificar no peito.

Ao vê-lo cair, Jacopo julgara-o morto e precipitara-se para ele, levantara-o, e por fim, uma vez levantado, tratara-o como um excelente camarada. O mundo não era portanto tão bom como o via o Dr. Pangloss, mas também não era tão mau como o via Dantès, uma vez que aquele homem que nada tinha a esperar do companheiro, excepto herdar a sua parte no bolo, experimentava tão viva aflição ao julgá-lo morto.

Felizmente, como dissemos, Edmond encontrava-se apenas ferido. Graças a certas ervas colhidas em determinadas épocas e vendidas aos contrabandistas por velhas sardas, o ferimento não tardou a fechar. Edmond quis então tentar Jacopo: ofereceu-lhe em troca dos seus cuidados a sua parte nos ganhos, mas Jacopo recusou com indignação.

Era devido à espécie de dedicação simpática que Jacopo dedicara a Edmond desde o primeiro momento em que o vira que Edmond concedia a Jacopo uma certa afeição. Mas Jacopo não pedia mais. Adivinhara instintivamente em Edmond a suprema superioridade da sua posição, superioridade que Edmond conseguira esconder dos outros. E com o pouco que Edmond lhe concedia o bravo marinheiro já ficava satisfeito.

Por isso, durante os longos dias passados a bordo, quando o navio, correndo com segurança pelo mar azul não necessitava, graças ao vento de feição que lhe enfunava as velas, mais do que da atenção do timoneiro, Edmond pegava num mapa marítimo e armava em professor de Jacopo, tal como o abade Faria se armara em professor com ele.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069