É assim que procedem e triunfam as gentes do Oriente, personagens graves e fleumáticas, que se preocupam pouco com questões de tempo nas conjecturas de certa importância.
- Resta a consciência - disse a Sr.ª de Villefort, com voz estrangulada e um suspiro abafado.
- Sim, felizmente resta a consciência, sem a qual seríamos infelicíssimos - concordou Monte-Cristo. - Depois de qualquer acção um pouco enérgica, é a consciência que nos salva, porque nos fornece mil boas desculpas, das quais só nós somos juízes. E essas razões, por mais excelentes que sejam para nos conservar o sono, talvez fossem medíocres perante um tribunal para nos conservar a vida. Assim, Ricardo III, por exemplo, deve ter sido maravilhosamente servido pela consciência depois da supressão dos dois filhos de Eduardo IV. Com efeito podia dizer para consigo: «Estes dois filhos de um rei cruel e perseguidor, e que tinham herdado os vícios do pai, que só eu soube reconhecer nas suas inclinações juvenis; estes dois filhos impediam-me de fazer a felicidade do povo inglês, de que teriam infalivelmente feito a infelicidade.” Assim foi servida pela sua consciência Lady Macbeth, que pretendia, ao contrário do que disse Shakespeare, dar um trono, não ao marido, mas sim ao filho. Ah, o amor materno é uma virtude tão grande, um móbil tão poderoso, que leva a desculpar muitas coisas! Por isso depois da morte de Duncan, Lady Macbeth teria sido infelicíssima sem a sua consciência.
A Sr.ª de Villefort absorvia com avidez estas medonhas máximas e estes horríveis paradoxos proferidos pelo conde com a ingénua ironia que lhe era peculiar. Passado um momento de silêncio, observou:
- Sabe, Sr. Conde, que é um terrível argumentador e que vê o mundo a uma luz um tanto lívida? Foi observando a humanidade através dos alambiques e das retortas que a julgou dessa maneira? Porque tinha razão, é um grande químico, e esse elixir que deu ao meu filho e que tão rapidamente o trouxe à vida...
- Oh, não exagere, minha senhora! - redarguiu Monte-Cristo. - Uma gota desse elixir bastou para trazer à vida uma criança que morria, mas três gotas ter-lhe-iam impelido o sangue para os pulmões de maneira a causar-lhe palpitações, seis cortar-lhe-iam a respiração e causar-lhe-iam uma síncope muito mais grave do que aquela em que se encontrava, e, finalmente, dez tê-lo-iam fulminado. Lembra-se, minha senhora, de o afastar daqueles frascos, nos quais tinha a imprudência detocar?
- Trata-se portanto de um veneno terrível?