Compreende: que me importava a mim, se a senhora pagava as lições da sua bolsa? Mas hoje verifico que o dinheiro sai da minha e que a sua aprendizagem me pode custar setecentos mil francos por mês... Alto aí, minha senhora, porque as coisas não podem continuar assim! Ou o diplomata passa a dar as lições... de graça, e tolerá-lo-ei, ou não põe mais os pés cá em casa. Compreendeu, minha senhora?
- Oh, é de mais, senhor! - gritou Hermine, sufocada. - O senhor ultrapassa os limites do ignóbil!
- Mas - continuou Danglars - verifico com prazer que a senhora não me fica atrás e que obedece voluntariamente àquela disposição do código que diz: «A mulher deve seguir o marido.»
- Insultos!
- Tem razão: fiquemo-nos pelos factos e raciocinemos friamente. Nunca me meti na sua vida a não ser para seu bem. Faça o mesmo. O meu cofre não lhe diz respeito, não é o que a senhora afirma? Seja. Cuide do seu, mas não encha nem despeje o meu. Aliás, quem sabe se tudo isso não passa de uma pulhice política? Se o ministro, furioso por me ver na oposição e invejoso das simpatias populares que suscito, não está feito com o Sr. Debray para me arruinar?
- Acha isso possível?
- Mas sem dúvida! Só quem nunca viu isso... uma falsa notícia telegráfica, isto é, o impossível ou quase... Sinais absolutamente diferentes transmitidos pelos dois últimos telégrafos!... Para mim, é esta a realidade.
- Senhor - disse mais humildemente a baronesa -, não ignora, parece-me, que esse funcionário foi expulso, que se falou até de lhe levantar um processo, que se deu ordem para o prender e que essa ordem teria sido cumprida se ele se não tivesse subtraído às primeiras buscas por meio de uma fuga que prova a sua loucura ou a sua culpabilidade... Foi um erro.
- Sim, que fez rir os tolos, passar uma má noite ao ministro, escrevinhar os Srs. Secretários de Estado, mas que me custou a mim setecentos mil francos.
- Mas, senhor - disse de súbito Hermine -, se tudo isso, em seu entender, é culpa do Sr. Debray, por que motivo, em vez de dizer todas essas coisas directamente ao Sr. Debray, mas diz amim? Porque acusa o homem e censura a mulher?
- Conheço porventura o Sr. Debray? - perguntou Danglars. Interessa-me porventura conhecê-lo? Quero porventura saber se ele dá conselhos? Estou porventura disposto a segui-los? Jogo, porventura? Não, é a senhora que faz tudo isto e não eu!
- Mas parece-me, uma vez que o senhor tira proveito disso...
Danglars encolheu os ombros.
- Loucas criaturas, na verdade, estas mulheres que se julgam génios só porque levaram a bom termo uma ou duas intrigas sem serem apontadas a dedo por todo o Paris!