Monte-Cristo inclinou-se para ela e levantou-a nos braços; e ao ver aquele belo rosto pálido, aqueles belos olhos fechados e aquele belo corpo inanimado e como que abandonado, ocorreu-lhe pela primeira vez a ideia de que ela talvez o amasse de forma diferente daquela como uma filha ama o pai.
- Infelizmente - murmurou com profundo desânimo -, tudo me é negado... E ainda poderia ser feliz! Depois, levou Haydée para os seus aposentos e entregou-a, sempre desmaiada, aos cuidados das suas criadas. E regressando ao seu gabinete, que desta vez fechou cuidadosamente, recopiou o testamento destruído.
Quando acabava, ouviu-se o ruído de um cabriolé que entrava no pátio. Monte-Cristo aproximou-se da janela e viu descer Maximilien e Emmanuel.
- Bom - disse para consigo -, era tempo! E lacrou o testamento em três sítios.
Um instante depois ouviu ruído de passos na sala e foi ele próprio abrir a porta. Morrel apareceu no limiar.
Chegara mais cedo cerca de vinte minutos.
- Talvez tenha vindo demasiado cedo, Sr. Conde, mas confesso-lhe francamente que não consegui dormir um minuto e que o mesmo aconteceu a toda a gente lá em casa.
Necessitava de o ver firme na sua corajosa decisão para eu próprio ganhar coragem.
Monte-Cristo não pôde ficar indiferente a esta prova de afeição, e não foi a mão que estendeu ao jovem, mas sim os dois braços que lhe abriu.
- Morrel - disse-lhe com voz emocionada -, é um belo dia para mim este em que me sinto estimado por um homem como o senhor. Bons dias, Sr. Emmanuel. Acompanham-me, portanto?...
- Meu Deus, duvidou disso?! - protestou o jovem capitão.
- Mas se eu não tivesse razão...
- Escute: observei-o ontem durante a cena da provocação, pensei na sua firmeza toda esta noite e disse para comigo que a justiça devia estar do seu lado ou então já não havia que fiar na expressão dos homens.
- Contudo, Morrel, Albert é seu amigo...
- Um simples conhecimento, conde.
- Não o viu pela primeira vez no mesmo dia em que me viu a mim?
- Vi, sim, é verdade. Mas que quer, É necessário que mo lembre para que eu o recorde.
- Obrigado, Morrel.
Em seguida tocou uma vez a campainha e disse a Ali, que apareceu imediatamente:
- Toma, manda entregar isto ao meu notário. É o meu testamento, Morrel. Se eu morrer, tomará conhecimento dele.
- Como? Se eu morrer?... - estranhou Morrel.
- Devemos prever tudo, caro amigo. Mas que fez ontem depois de me deixar?
- Fui ao Tortoni, onde, como esperava, encontrei Beauchamp e Château-Renaud. Confesso-lhe que os procurava.