- De facto... - declarou Morrel. - Ouça, Valentine: o Sr. Noirtier talvez tenha razão; há quinze dias que noto que a sua saúde se altera.
- Sim, um bocadinho, é verdade - admitiu Valentine. - Por isso, o avozinho constituiu-se meu médico, e como o avozinho sabe tudo, tenho a maior confiança nele.
- Mas, enfim, é verdade que se sente doente, Valentine? - perguntou vivamente Morrel.
- Meu Deus, não se pode dizer que me sinta doente; experimento apenas um mal-estar geral. Perdi o apetite e parece-me que o meu estômago trava uma luta para se habituar a qualquer coisa.
Noirtier não perdia uma palavra de Valentine.
- E qual é o tratamento que segue contra essa doença desconhecida?
- Oh, muito simples! - respondeu Valentine. - Tomo todas as manhãs uma colher da poção que dão ao meu avô. Digo uma colher, mas a verdade é que comecei por uma e agora já vou em quatro... O avô pretende que é uma panaceia.
Valentine sorria, mas havia algo de triste e sofredor no seu sorriso.
Maximilien, ébrio de amor, olhava-a em silêncio. Estava linda, mas a sua palidez adquirira um tom mais macilento, nos seus olhos brilhava um fogo mais ardente do que de costume e as suas mãos, habitualmente de um branco de madrepérola, pareciam mãos de cera que com o tempo adquirissem um tom amarelado.
De Valentine, o jovem olhou para Noirtier, que observava com estranha e profunda atenção a neta, absorta no seu amor.
Também o velho, como Morrel, notava aqueles vestígios de um sofrimento surdo, tão pouco visíveis, aliás, que tinham escapado aos olhos de todos, excepto aos do avô e do apaixonado.
- Mas essa poção, de que já vai em quatro colheres, creio ter sido receitada ao Sr. Noirtier... - observou Morrel.
- É verdade - respondeu Valentine. - E é muito amarga... Tão amarga que tudo o que bebo depois me parece ter o mesmo gosto.
Noirtier olhou a neta com ar interrogador.
- Sim, avozinho - confirmou Valentine -, é como lhe digo.
Ainda há bocado, antes de descer, bebi um copo de água açucarada. Pois tive de desistir a meio, de tal forma a água me pareceu amarga.
Noirtier empalideceu e fez sinal de que queria falar. Valentine levantou-se para ir buscar o dicionário. Noirtier seguiu-a com a vista, visivelmente angustiado.
Com efeito, o sangue subia à cabeça da jovem, coloria-lhe as faces.
- É singular: um deslumbramento! - exclamou Valentine, sem perder nada da sua boa disposição. - Como é que o sol me bateu nos olhos?...
E apoiou-se no parapeito da janela.
- Não há sol - disse Morrel, ainda mais inquieto com a expressão de Noirtier do que com a indisposição de Valentine.