O Conde de Monte Cristo - Cap. 95: O pai e a filha Pág. 896 / 1080

Moía pela vigésima vez este pensamento inquietante no cérebro quando a porta se abriu e Eugénie apareceu, de vestido do cetim preto salpicado de flores mates da mesma cor, em cabelo e enluvada como se fosse ocupar a sua poltrona no Teatro Italiano.

- Então, Eugénie, que temos? - perguntou o pai. - E porquê o salão, com toda a sua solenidade, quando podias estar tão bem no meu gabinete particular?

- Tem toda a razão, senhor - respondeu Eugénie, fazendo sinal ao pai de que se podia sentar -, e acaba de fazer duas perguntas que resumem antecipadamente toda a conversa que vamos ter. Vou portanto responder a ambas. E, contra as leis do hábito, primeiro à segunda, por ser a menos complexa. Escolhi o salão, senhor, para local de encontro, a fim de evitar as impressões desagradáveis e as influências do gabinete de um banqueiro. Os livros de caixa, por mais dourados que sejam, as gavetas fechadas como portas de fortalezas, os maços de notas vindos ninguém sabe donde e as quantidades de cartas vindas de Inglaterra, da Holanda, da Espanha, da índia, da China e do Peru actuam em geral estranhamente sobre o espírito de um pai e fazem-no esquecer que existe no mundo um interesse maior e mais sagrado do que o da posição social e da opinião dos seus clientes. Escolhi portanto o salão, onde vê, sorridentes e felizes nas suas magníficas molduras, o seu retrato, o meu, o da minha mãe e todo o género de paisagens pastoris e bucólicas enternecedoras. Confio muito na influência das impressões exteriores. Talvez, sobretudo em relação ao senhor, seja um erro; mas que quer, não seria artista se me não restassem algumas ilusões.

- Muito bem - respondeu o Sr. Danglars, que escutara a tirada com imperturbável sangue-frio, mas sem compreender uma palavra, absorto como estava, como qualquer homem cheio de ideias preconcebidas, a procurar o fio da sua própria ideia nas ideias da interlocutora.

- Está portanto o segundo ponto esclarecido, ou quase - disse Eugénie, sem o menor constrangimento e com a desenvoltura muito masculina que a caracterizava -, e o senhor parece-me satisfeito com a explicação. Agora voltemos ao primeiro.

»Perguntava-me por que solicitara esta audiência. Vou dizer-lho em duas palavras. Ei-las, senhor: não quero casar com o Sr. Conde Andrea Cavalcanti.

Danglars deu um pulo na poltrona e, no impulso, levantou ao mesmo tempo os olhos e os braços ao céu.

- Meu Deus, sim, senhor - continuou Eugénie, sempre muito calma. - Está surpreendido, bem vejo, porque desde que toda essa combinaçãozinha está em marcha não manifestei a mais pequena oposição, certa como estou sempre de, na altura própria, opor francamente às pessoas que em nada me consultaram e às coisas que me desagradam uma vontade franca e absoluta.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069