O Conde de Monte Cristo - Cap. 106: A partilha Pág. 987 / 1080

Até ali, a Sr.ª Danglars talvez esperasse ainda alguma coisa; mas quando viu o gesto indiferente que acabava de escapar a Debray e o olhar oblíquo com que esse gesto fora acompanhado, assim como a reverência profunda e o silêncio significativo que se seguiram, ergueu a cabeça, abriu a porta e, sem cólera, sem nervosismo, mas também sem hesitação, dirigiu-se para a escada, desdenhando até honrar com um derradeiro cumprimento àquele que a deixava partir daquele modo.

- Ora, ora! - exclamou Debray depois dela sair. - Apesar de poder fazer belos projectos, ficará no seu palácio, lerá romances e jogará o seu lansquené, visto não poder jogar na bolsa.

Em seguida pegou na agenda e riscou cuidadosamente as importâncias que acabava de pagar.

- Resta-me um milhão e sessenta mil francos... Que pouca sorte Mademoiselle de Villefort ter morrido! Era a mulher que me convinha sob todos os aspectos para casar com ela.

E, fleumaticamente, conforme era seu hábito, esperou que a Sr.ª Danglars tivesse saído há vinte minutos para se decidir a sair por sua vez.

Durante esses vinte minutos, Debray fez contas, com o relógio pousado a seu lado.

Essa personagem diabólica que qualquer imaginação aventurosa criaria com mais ou menos felicidade se Le Sage lhe não tivesse adquirido a prioridade na sua obra-prima; esse Asmodeu que levantava os telhados das casas para as ver por dentro, teria gozado um singular espectáculo se erguesse, no momento em que Debray fazia as suas contas, o telhado do prediozito da Rua Saint-Germain-des-Prés.

Por cima do quarto em que Debray acabava de dividir com a Sr.ª Danglars dois milhões e meio ficava outro também habitado por pessoas nossas conhecidas, as quais desempenharam papel muito importante nos acontecimentos que contámos até aqui e que por isso reencontramos com algum interesse.

Nesse quarto residiam Mercédès e Albert.

Mercédès mudara muito havia alguns dias. Não porque, mesmo no tempo da sua maior riqueza, alguma vez tivesse exibido o fausto orgulhoso que corta visivelmente com todas as condições e faz com que se deixe de reconhecer imediatamente a mulher quando nos surge mais simplesmente vestida; nem porque tivesse caído nesse estado de depressão em que somos obrigados a envergar a libré da miséria. Não, Mercédès estava mudada porque os seus olhos já não brilhavam, porque a sua boca já não sorria, porque finalmente um perpétuo enleio lhe detinha nos lábios a palavra pronta que denotava outrora um espírito sempre atento.

Não fora a pobreza que secara o espírito de Mercédès, nem era a falta de coragem que lhe tornava pesada a pobreza.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069