Num esforço supremo, Dantès ergueu-se imediatamente quase de pé na água, agitou o barrete e soltou um desses gritos arrepiantes como os dos marinheiros em perigo e que parecem lamentos de qualquer génio do mar.
Desta vez viram-no e ouviram-no. A tartana interrompeu a sua manobra e aproou para o seu lado. Ao mesmo tempo, Dantès viu que se preparavam para lançar uma chalupa ao mar.
Pouco depois a chalupa, tripulada por dois homens, dirigiu-se ao seu encontro, batendo o mar com o seu remo duplo. Dantès deixou então deslizar a trave, de que pensava já não necessitar, e nadou vigorosamente para poupar metade do caminho aos que vinham ao seu encontro.
O nadador contara porém com forças quase esgotadas. Foi então que teve consciência de como lhe fora útil o bocado de madeira que flutuava já, inerte, a cem passos de si. Os braços começavam a ficar-lhe dormentes e as pernas tinham perdido a flexibilidade. Os seus movimentos eram rígidos e sacudidos e tinha o peito arquejante.
Soltou um grande grito, os dois remadores redobraram de energia e um deles gritou-lhe em italiano:
- Coragem! A palavra chegou-lhe aos ouvidos no momento em que uma vaga que já não tivera força para transpor lhe passava por cima da cabeça e o cobria de espuma.
Reapareceu batendo o mar com os movimentos desencontrados e desesperados de um homem prestes a afogar-se, soltou terceiro grito e sentiu-se mergulhar no mar como se ainda tivesse agarrado aos pés o pelouro mortal.
A água passou-lhe por cima da cabeça e através dela viu o céu lívido com manchas negras.
Um esforço violento trouxe-o à superfície. Pareceu-lhe então que o agarravam pelos cabelos. Depois, não viu nem ouviu mais nada; desmaiara.
Quando reabriu os olhos, Dantès encontrou-se na coberta da tartana, que continuava a sua rota. O seu primeiro olhar foi para verificar que direcção seguia: continuava a afastar-se do Castelo de If
Dantès estava tão exausto que a exclamação de alegria que soltou foi tomada por um gemido de dor.
Como dissemos, estava deitado na coberta e um marinheiro esfregava-lhe os membros com um cobertor de lã. Outro, que reconheceu ser o que lhe gritara «Coragem!», introduzia-lhe o gargalo de uma garrafa empalhada na boca. Um terceiro, velho marinheiro que era ao mesmo tempo o piloto e o patrão, olhava-o com o sentimento de compaixão egoísta que experimentam em geral os homens acerca de um infortúnio a que escaparam na véspera e que os pode atingir no dia seguinte.