O Conde de Monte Cristo - Cap. 59: O testamento Pág. 576 / 1080

Leram a Noirtier uma fórmula de testamento vaga, vulgar; depois, para começar, por assim dizer, a investigação acerca da sua inteligência, o primeiro notário disse-lhe, virando-se para ele:

- Quando se faz um testamento, senhor, é a favor de alguém...

- Pois é - respondeu Noirtier.

- Tem alguma ideia da importância a quanto monta a suafortuna?

- Tenho.

- Vou dizer várias importâncias, que irão subindo gradualmente. Deter-me-á quando atingir aquela que julgue ser a sua.

- Pois sim.

Havia neste interrogatório uma espécie de solenidade. Aliás, nunca a luta da inteligência contra a matéria fora talvez mais visível. E se não era um sublime, como íamos a dizer, era pelo menos um curioso espectáculo.

Formara-se roda à volta de Noirtier. O segundo notário estava sentado a uma mesa, pronto para escrever. O primeiro estava de pé diante de Noirtier e interrogava-o.

- A sua fortuna ultrapassa os trezentos mil francos, não é verdade?

Noirtier fez sinal que sim.

- Possui quatrocentos mil francos? - perguntou o notário.

Noirtier ficou imóvel.

- Quinhentos mil?

A mesma imobilidade.

- Seiscentos mil? Setecentos mil? Oitocentos mil? Novecentos mil? Noirtier fez sinal que sim.

- Possui novecentos mil francos?

- Possuo.

- Em imóveis? - perguntou o notário.

Noirtier fez sinal que não.

- Em títulos de dívida pública?

Noirtier fez sinal que sim.

- Esses títulos estão em seu poder? Uma olhadela dirigida a Barrois fez sair o velho servidor, que regressou pouco depois com uma caixinha.

- Permite-me que abra esta caixa? - perguntou o notário.

Noirtier fez sinal que sim.

Aberta a caixa, encontraram-se títulos de dívida pública no valor de novecentos mil francos.

O primeiro notário passou, um após outro, cada título ao colega. A soma era a indicada por Noirtier.

- Está certa - disse o segundo notário. - É evidente que a inteligência se encontra em toda a sua capacidade e extensão.

O primeiro notário virou-se então para o paralítico e disse-lhe:

- O senhor possui portanto novecentos mil francos de capital, que, dada a forma como estão investidos, lhe devem dar quarenta mil libras de rendimento, aproximadamente...

- É verdade - respondeu Noirtier.

- A quem deseja deixar essa fortuna?

- Oh - interveio a Sr.ª de Villefort -, quanto a isso não há qualquer dúvida! O Sr. Noirtier ama unicamente a neta, Mademoiselle Valentine de Villefort. E ela que cuida dele há seis anos. Soube cativar com os seus cuidados assíduos a afeição do avô e quase direi o seu reconhecimento. É portanto justo que receba a paga da sua dedicação.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069