O Conde de Monte Cristo - Cap. 101: Locusta Pág. 944 / 1080

A jovem estremeceu até ao fundo do coração, mas não respondeu.

- Valentine! - repetiu a mesma voz.

Igual silêncio: Valentine prometera não acordar.

Depois tudo permaneceu imóvel.

Valentine ouviu apenas o ruído quase imperceptível de um líquido a cair no copo que acabara de despejar.

Então atreveu-se, a coberto do braço estendido, a entreabrir as pálpebras.

Viu uma mulher de penteador branco que deitava no copo um licor preparado antecipadamente num frasco.

Durante esse curto instante, Valentine conteve talvez a respiração ou fez sem dúvida algum movimento porque a mulher deteve-se e inclinou-se sobre a cama para ver melhor se ela dormia realmente: era a Sr.ª de Villefort.

Ao reconhecer a madrasta, Valentine foi atacada por calafrios intensos, que imprimiram movimento à cama.

A Sr.ª de Villefort afastou-se imediatamente ao longo da parede e aí, escondida atrás dos cortinados da cama, muda, atenta, espiou o mais pequeno movimento de Valentine.

Esta recordou-se das terríveis palavras de Monte-Cristo; parecera-lhe ver brilhar na mão que segurava o frasco uma espécie de punhal comprido e aguçado. Então, apelando para toda a força da sua vontade em seu auxílio, esforçou-se por fechar os olhos. Mas tal função do mais sensível dos nossos sentidos, tal função, habitualmente tão simples, tornava-se naquele momento quase impossível de executar, de tal modo a ávida curiosidade se esforçava por repelir as pálpebras e atrair a verdade.

Entretanto, tranquilizada pelo silêncio em que recomeçara a ouvir-se o ruído compassado da respiração de Valentine, sinal de que esta dormia, a Sr.ª de Villefort estendeu de novo o braço e, permanecendo meio escondida pelos cortinados apanhados à cabeceira da cama, acabou de deitar no copo de Valentine o conteúdo do frasco.

Depois retirou-se, sem que o mais pequeno ruído advertisse Valentine de que se fora embora.

Esta vira apenas desaparecer o braço, mais nada; o braço fresco e torneado de uma mulher de vinte e cinco anos, jovem e bela que derramava a morte.

É impossível exprimir o que Valentine experimentou durante o minuto e meio que a Sr.ª de Villefort permanecera no seu quarto.

O ruído de unhas na estante arrancou a jovem ao estado de torpor em que mergulhara e que se assemelhava à perda dos sentidos.

Levantou a cabeça com esforço.

A porta, sempre silenciosa, girou segunda vez nos gonzos e o conde de Monte-Cristo reapareceu.

- Então, ainda duvida? - perguntou o conde.

- Oh, meu Deus! - murmurou a jovem.

- Viu?

- Infelizmente!

- Reconheceu a pessoa?

Valentine soltou um gemido.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069