O Conde de Monte Cristo - Cap. 105: O Cemitério do Père-lachaise Pág. 971 / 1080

Toda a gente sabe como decorre um funeral naquela magnífica necrópole: grupos de preto espalhados pelas brancas alamedas, o silêncio do céu e da terra perturbado pelo estalar de algum ramo quebrado, de alguma sebe derrubada à volta de uma sepultura; depois, o canto melancólico dos padres, ao qual se junta, aqui e ali, um soluço escapado de um maciço de flores sob o qual se vê alguma mulher, absorta e de mãos postas.

A sombra que Monte-Cristo notara atravessou rapidamente o quincôncio disposto atrás do túmulo de Heloísa e Abelardo, veio colocar-se, com os moços de cangalheiro, à frente dos cavalos que puxavam a carreta e do mesmo passo chegou ao local escolhido para a sepultura.

Toda a gente olhava para qualquer coisa.

Monte-Cristo só olhava para aquela sombra em que mal tinham reparado aqueles que a rodeavam.

O conde saiu por duas vezes do seu lugar para ver se as mãos daquele homem não procurariam alguma arma oculta no vestuário.

Quando o cortejo parou, verificou-se que a sombra era nem mais nem menos do que Morrel, que, com a sua sobrecasaca preta abotoada até acima, a testa lívida, as faces encovadas e o chapéu amarrotado pelas mãos convulsas, se encostara a uma árvore situada num cabeço que dominava o jazigo, de forma a não perder nenhum dos pormenores da cerimónia fúnebre que se ia realizar.

Tudo se passou como de costume. Alguns homens, como sempre os menos impressionados, pronunciaram discursos.

Uns lamentavam aquela morte prematura; outros dissertavam sobre a dor do pai, e alguns, bastante engenhosos, descobriram que por mais de uma vez a jovem solicitara ao Sr. de Villefort compaixão para os culpados sobre a cabeça dos quais ele tinha suspenso o gládio da justiça. Enfim, esgotaram-se as metáforas floridas e os períodos dolorosos, interpretando de todas as maneiras as estrofes de Malherbe a Dupérier.

Monte-Cristo não escutava nem via nada, ou antes, só via Morrel, cuja calma e imobilidade constituíam um espectáculo assustador para a única pessoa que podia ler o que se passava no fundo do coração do jovem oficial.

- Ali está Morrel - disse de súbito Beauchamp a Debray. – Onde diabo se terá metido?

E fizeram-no notar a Château-Renaud.

- Como está pálido - observou este, estremecendo.

- Deve ter frio - replicou Debray.

- Não - disse lentamente Château-Renaud. - Creio que está impressionado. Maximilien é um homem muito impressionável.

- Mas se mal conhecia Mademoiselle de Villefort! - estranhou Debray. - Foi você mesmo quem o disse...





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069