A Queda de um Anjo - Cap. 8: Capítulo 8 Pág. 38 / 207

Entrou o conde, e disse com grande alvoroço:

— Venho apertar nos braços um parente, que me honra tanto com a inteligência, quanto seus avós me honraram com a lança.

Calisto permaneceu imóvel na cadeira, e tirando os óculos de prata, disse:

— Falta saber se meus avós se honraram dos avós de V. Exa..

— Eu sou o conde do Reguengo — disse o outro, atónito.

— Já sei. O conde do Reguengo é o décimo sexto varão de Martim Annes de Barbuda?

— Sou eu mesmo.

Calisto ergueu-se, montou os óculos, foi mui de pausa e a passo mesurado à estante dos seus livros, e tirou um in-fólio. Voltou a sentar-se, mandou sentar o conde, abriu o livro e disse:

— Esta é a crónica dos reis, escrita por Duarte Nunes de Leão, e mandada publicar por D. Rodrigo da Cunha, arcebispo de Lisboa. Abro a página vinte e três, e peço ao excelentíssimo conde do Reguengo que leia.

O conde recebeu entre mãos a crónica, e leu o seguinte desde o parágrafo indigitado por Calisto:

«As razões que ao Mestre moviam a apressar sua ida para fora de Portugal era conhecer a condição da Rainha, que além do natural das mulheres, que é serem vingativas, ela o era mais que todas; mas, como mulher de grandes espíritos, e astuta que era, onde maior ódio tinha, ali mostrava mais benevolência, pelo que o Mestre tinha por mui suspeita a mostra de amizade que lhe fazia, e se temia mais dela, e tanto cria que lhe tinha maior ódio, quanto mais afeiçoada era ela ao conde João Fernandes, de quem ele a apartou. Ajuntava-se a isto ter ela mandado chamar a El-Rei de Castela.





Os capítulos deste livro