O Conde de Monte Cristo - Cap. 108: O juiz Pág. 1004 / 1080

O cortinado estava corrido.

E no entanto a imagem do pai estava-lhe de tal modo presente que se dirigiu à janela fechada como se estivesse aberta e visse ainda o velho ameaçador.

- Sim - murmurou -, sim, pode estar tranquilo! A cabeça descaiu-lhe para o peito e com ela assim inclinada deu alguns passos no gabinete. Por fim; atirou-se vestido para cima de um canapé, menos para dormir do que para descontrair os membros insensibilizados pela fadiga e pelo frio, que lhe penetrara até à medula dos ossos.

Pouco a pouco toda a gente se levantou. Do seu gabinete, Villefort ouviu o sucessivos ruídos que constituíam por assim dizer a vida da casa: as portas maciças em movimento, o toque da campainha da Sr.ª de Villefort a chamar a sua criada de quarto, os primeiros gritos do garoto, que se levantava alegre como nos levantamos habitualmente na sua idade.

Villefort tocou por seu turno. O seu novo criado de quarto entrou e entregou-lhe os jornais.

Juntamente com os jornais trouxe uma chávena de chocolate.

- Que me traz aí? - perguntou Villefort.

- Uma chávena de chocolate.

- Não a pedi. Quem tomou essa decisão por mim? - A senhora. Disse-me que o senhor falaria decerto muito hoje, nesse caso de assassínio, e que necessitava de recuperar forças.

E o criado pôs em cima da mesa colocada junto do canapé - mesa, como todas as outras, carregada de papéis - a chávena de prata dourada

Depois, saiu.

Villefort olhou um instante a chávena, com ar sombrio, e depois, de súbito, pegou-lhe com um gesto nervoso e bebeu de um só trago a beberagem que continha. Dir-se-ia esperar que a beberagem fosse mortal e que procurava a morte para o libertar de um dever que lhe ordenava coisa muito mais difícil do que morrer. Depois levantou-se e passeou no gabinete com uma espécie de sorriso, que seria terrível de ver se alguém o visse.

O chocolate era inofensivo e o Sr. de Villefort não experimentou nada.

Chegada a hora do pequeno-almoço, o Sr. de Villefort não apareceu à mesa. O criado de quarto voltou a entrar-lhe no gabinete.

- A senhora manda prevenir o senhor de que acabam de dar onze horas e a audiência está marcada para o meio-dia.

- E depois? - perguntou Villefort.

- A senhora arranjou-se, está pronta, e pergunta se pode acompanhar o senhor.

- Aonde?

- Ao Palácio da Justiça.

- Para quê?

- A senhora diz que gostaria muito de assistir à audiência.

- Ah, ela disse isso?! - exclamou Villefort num tom quase assustador.

O criado recuou um passo e sugeriu:

- Se o senhor deseja ir só, eu vou dizer à senhora.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069