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Capítulo 108: O juiz

Página 1003

O mais provável era que a carícia maternal lhe não parecesse recompensa suficiente para o incómodo que ia ter. Por fim decidiu-se, saltou da janela para o meio de um canteiro de heliolrópios e rainhas-margaridas e correu para a Sr.ª de Villefort com a testa coberta de suor. A Sr.ª de Villefort limpou-lha, pousou os lábios naquele marfim húmido e mandou o garoto embora com a bola numa das mãos e um punhado de bombons na outra.

Levado por invencível atracção, tal como o passarinho é atraído pela serpente, Villefort aproximou-se de casa. à medida que se aproximava, o olhar de Noirtier baixava-se para o seguir, e o fogo das suas pupilas parecia adquirir tal grau de incandescência que Villefort se sentia devorado por ele até ao fundo do coração. Com efeito, lia-se naquele olhar uma cruel censura, ao mesmo tempo que uma terrível ameaça. Então, as pálpebras e os olhos de Noirtier ergueram-se ao céu, como se recordasse ao filho um juramento esquecido.

- Está bem, senhor - replicou Villefort de baixo, do pátio -, está bem! Tenha paciência durante mais um dia. o que disse está dito.

Noirtier pareceu acalmar-se com estas palavras e os seus olhos viraram-se com indiferença para outro lado.

Villefort desabotoou violentamente a sobrecasaca que o sufocava, passou a mão lívida pela testa e regressou ao seu gabinete.

A noite passou-se fria e tranquila; toda a gente se deitou e dormiu como de costume naquela casa. Apenas, também como de costume, Villefort não se deitou ao mesmo tempo que os outros e trabalhou até às cinco da manhã, a rever os últimos interrogatórios feitos na véspera pelos magistrados instrutores, a compulsar os depoimentos das testemunhas e a burilar o seu libelo acusatório, um dos mais enérgicos e habilmente concebidos que até então redigira.

Era no dia seguinte, segunda-feira, que se devia realizar a primeira audiência. Villefort viu despontar esse dia baço e sinistro e a sua claridade acinzentada fez brilhar no papel as linhas traçadas a tinta vermelha. O magistrado adormecera um instante, enquanto o candeeiro dava os últimos suspiros.

As crepitações da torcida acordaram-no, com os dedos húmidos e avermelhados como se os tivesse mergulhado em sangue.

Abriu a janela. Uma grande faixa alaranjada atravessava ao longe o céu e cortava em dois os álamos esguios que se perfilavam a negro no horizonte. No campo de luzerna, do outro lado do portão dos castanheiros, uma cotovia subia no céu, emitindo o seu canto claro e matinal.

O ar húmido do amanhecer inundou a cabeça de Villefort e refrescou-lhe a memória.

- Será hoje - disse com esforço. - Hoje, o homem que vai empunhar o gládio da justiça deve ferir onde quer que se encontrem os culpados.

O seu olhar dirigiu-se então, mal-grado seu, para a janela de Noirtier, que se projectava em ângulo recto, para a janela onde vira o velho na véspera.

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Capa do livro O Conde de Monte Cristo
Páginas: 1080
Página atual: 1003

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Marselha - A Chegada 1
O pai e o filho 8
Os Catalães 14
A Conspiração 23
O banquete de noivado 28
O substituto do Procurador Régio 38
O interrogatório 47
O Castelo de If 57
A festa de noivado 66
Os Cem Dias 89
O número 34 e o número 27 106
Um sábio italiano 120
A cela do abade 128
O Tesouro 143
O terceiro ataque 153
O cemitério do Castelo de If 162
A Ilha de Tiboulen 167
Os contrabandistas 178
A ilha de Monte-Cristo 185
Deslumbramento 192
O desconhecido 200
A Estalagem da Ponte do Gard 206
O relato 217
Os registos das prisões 228
Acasa Morrel 233
O 5 de Stembro 244
Itália - Simbad, o marinheiro 257
Despertar 278
Bandidos Romanos 283
Aparição 309
A Mazzolata 327
O Carnaval de Roma 340
As Catacumbas de São Sebastião 356
O encontro 369
Os convivas 375
O almoço 392
A apresentação 403
O Sr. Bertuccio 415
A Casa de Auteuil 419
A vendetta 425
A chuva de sangue 444
O crédito ilimitado 454
A parelha pigarça 464
Ideologia 474
Haydée 484
A família Morrel 488
Píramo e Tisbe 496
Toxicologia 505
Roberto, o diabo 519
A alta e a baixa 531
O major Cavalcanti 540
Andrea Cavalcanti 548
O campo de Luzerna 557
O Sr. Noirtier de Villefort 566
O testamento 573
O telégrafo 580
Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588
Os fantasmas 596
O jantar 604
O mendigo 613
Cena conjugal 620
Projetos de casamento 629
No gabinete do Procurador Régio 637
Um baile de Verão 647
As informações 653
O baile 661
O pão e o sal 668
A Sra. de Saint-Méran 672
A promessa 682
O jazigo da família Villefort 705
A ata da sessão 713
Os progressos de Cavalcanti filho 723
Haydée 732
Escrevem-nos de Janina 748
A limonada 762
A acusação 771
O quarto do padeiro reformado 776
O assalto 790
A mão de Deus 801
Beauchamp 806
A viagem 812
O julgamento 822
A provocação 834
O insulto 840
A Noite 848
O duelo 855
A mãe e o filho 865
O suicídio 871
Valentine 879
A confissão 885
O pai e a filha 895
O contrato 903
A estrada da Bélgica 912
A estalagem do sino e da garrafa 917
A lei 928
A aparição 937
Locusta 943
Valentine 948
Maximilien 953
A assinatura de Danglars 961
O Cemitério do Père-lachaise 970
A partilha 981
O covil dos leões 994
O juiz 1001
No tribunal 1009
O libelo acusatório 1014
Expiação 1021
A partida 1028
O passado 1039
Peppino 1049
A ementa de Luigi Vampa 1058
O Perdão 1064
O 5 de Outubro 1069