O Conde de Monte Cristo - Cap. 14: O prisioneiro furioso e o prisioneiro louco Pág. 102 / 1080

- É por isso que me sinto tão feliz por o ver - continuou o abade -, embora me tenha interrompido na altura em que fazia um cálculo muito importante que, se for bem sucedido, talvez modifique o sistema de Newton. Pode conceder-me o favor de uma palavrinha em particular?

- Bem, que dizia eu? - observou o governador ao inspector.

- O senhor conhece a sua gente - respondeu este último sorrindo.

E dirigindo-se ao abade Faria:

- Senhor, o que me pede é impossível.

- No entanto - insistiu o abade -, trata-se de fazer ganhar ao governo uma importância enorme, uma soma de cinco milhões, por exemplo...

- Formidável! - exclamou o inspector, virando-se por sua vez para o governador. - O senhor previu até a importância.

- Vejamos - prosseguiu o abade, notando que o inspector fazia um movimento para se retirar. - Não é necessário que estejamos absolutamente sós; o Sr. Governador poderá assistir à nossa conversa.

- Meu caro senhor - interveio o governador -, para seu mal, sabemos antecipadamente e de cor o que vai dizer. Trata-se dos seus tesouros, não é verdade? Faria olhou aquele homem zombeteiro com olhos onde um observador desinteressado teria decerto visto brilhar a faísca da razão e da verdade.

- Sem dúvida - respondeu - De que quer o senhor que eu fale a não ser disso?

- Sr. Inspector - continuou o governador -, posso contar-lhe essa história tão bem como o abade, pois há quatro ou cinco anos que me enche os ouvidos com ela.

- Isso prova, Sr. Governador - redarguiu o abade -, que é como essas pessoas de que fala a Escritura, que têm olhos e não vêem e têm ouvidos e não ouvem.

- Meu caro senhor - disse o inspector -, o Governo é rico e graças a Deus, não precisa do seu dinheiro. Guarde-o, pois, para o dia em que sair da prisão.

Os olhos do abade dilataram-se. Pegou na mão do inspector.

- Mas se não sair da prisão - observou -, se, contra toda a justiça, me retiverem nesta masmorra e aqui morrer sem legar o meu segredo à ninguém, esse tesouro perder-se-á? Não épreferívelque o Governo o aproveite e eu também? Irei até seis milhões, senhor. Sim, renunciarei a seis milhões e contentar-me-ei com o resto se me restituírem à liberdade.

- Palavra - disse o inspector a meia voz -, se não soubéssemos que este homem está louco era caso para acreditar. Fala em tom tão convicto que parece dizer a verdade.

- Não estou louco, senhor, e digo a verdade - insistiu Faria, que, com a finura de ouvido peculiar aos prisioneiros, não perdera uma única das palavras do inspector. - O tesouro de que lhe falo existe realmente e proponho-me assinar um acordo convosco em virtude do qual me conduzirão ao sítio designado por mim.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069