O Conde de Monte Cristo - Cap. 14: O prisioneiro furioso e o prisioneiro louco Pág. 103 / 1080

Escavar-se-á a terra diante dos nossos olhos e se eu mentir, se não se encontrar nada, se eu for um louco, como os senhores dizem, então tornarão a meter-me nesta mesma masmorra, onde ficarei eternamente e morrerei sem pedir mais nada aos senhores nem a ninguém.

O governador desatou a rir.

- Está muito longe daqui o seu tesouro? - perguntou.

- A cem léguas, pouco mais ou menos - respondeu Faria.

- A coisa não está mal imaginada - observou o governador. – Se todos os prisioneiros quisessem divertir-se a passear os seus guardas durante cem léguas, e se os guardas consentissem em fazer semelhante passeio, seria uma excelente oportunidade para os prisioneiros arranjarem maneira de se evadir na primeira ocasião, a qual, decerto, não deixaria de surgir.

- É um meio conhecido - comentou o inspector - e o cavalheiro nem sequer tem o mérito da invenção.

Depois, virando-se para o abade:

- Perguntei-lhe se era bem alimentado.

- Senhor - respondeu Faria -, jure-me sobre o Cristo libertar-me se lhe tiver dito a verdade e indicar-lhe-ei o sítio onde o tesouro está enterrado.

- É bem alimentado? - repetiu o inspector.

- Senhor, não arrisca nada assim e bem vê que não é para arranjar uma oportunidade de fugir que lhe faço esta proposta, pois ficarei na prisão enquanto fizer a viagem.

- Não respondeu à minha pergunta - observou com impaciência o inspector.

- Nem o senhor à minha proposta! - exclamou o abade. - Seja portanto maldito como os outros insensatos que me não quiseram acreditar! Já que não quer o meu ouro, guardá-lo-ei; recusa-me a liberdade, Deus mandar-ma-á. Vá-se embora, não tenho mais nada a dizer.

E o abade largou o cobertor, voltou a pregar no seu bocado de gesso e foi-se sentar de novo no meio do seu círculo, onde continuou entregue às suas linhas e aos seus cálculos.

- Que está a fazer? - perguntou a inspector ao retirar-se.

- A contar os seus tesouros - respondeu o governador.

Faria retribuiu o sarcasmo com um olhar carregado do mais supremo desprezo.

Saíram. O carcereiro fechou a porta atrás deles.

- Deve ter, com efeito, possuído alguns tesouros - disse o inspector ao subirem a escada.

- Sim, deve ter sonhado que os possuía - respondeu o governador - e no dia seguinte acordou louco.

- Efectivamente - admitiu o inspector com a simplicidade de quem admite a corrupção -, se fosse realmente rico não estaria preso.

Assim terminou a aventura para o abade Faria. Continuou prisioneiro e depois desta visita a sua reputação de louco divertido ainda mais aumentou.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069