O Conde de Monte Cristo - Cap. 18: O Tesouro Pág. 149 / 1080

»O famoso breviário permanecera na família e era o conde de Spada quem o possuía. Tinham-no conservado de pais para filhos, pois a cláusula estranha do único testamento encontrado transformara-o numa autêntica relíquia guardada em supersticiosa veneração na família. Era um livro iluminado com as mais belas figuras góticas, e tão pesado, de ouro, que um criado é que o levava sempre diante do cardeal nos dias de grande solenidade.

»Perante documentos de todos os géneros - títulos, contratos, pergaminhos, etc. - guardados nos arquivos da família e todos provenientes do cardeal envenenado, pus-me por meu turno, como vinte servidores, vinte intendentes e vinte secretários que me tinham precedido, a compulsar os maços formidáveis constituídos por essa papelada. Mas, apesar da actividade e do cuidado com que me dedicava às minhas pesquisas, não encontrava absolutamente nada. No entanto, lera e até escrevera uma história exacta e quase efemerídica da família dos Bórgias, com a única finalidade de me assegurar se a fortuna desses príncipes aumentara à datada morte do meu cardeal César Spada, mas apenas notei a adição dos bens do cardeal Rospijoíiosi, seu companheiro de infortúnio.

»Estava portanto quase certo de que a herança não aproveitara nem aos Bórgias nem a família, mas sim ficara sem dono, como esses tesouros dos contos árabes que dormem no seio da terra sob a guarda de um génio. Espiolhei, conferi e calculei milhares e milhares de vezes os rendimentos e as despesas da família durante trezentos anos. Tudo foi inútil: eu fiquei na minha e o conde de Spada na sua miséria.

»O meu patrão morreu. Da sua renda vitalícia exceptuara os seus documentos de família, a sua biblioteca constituída por cinco mil volumes e o seu famoso breviário. Legou-me tudo isso, juntamente com um milhar de escudos romanos que possuía em dinheiro, com a condição de mandar dizer missas anuais e de organizar uma árvore genealógica e uma história da sua casa, o que fiz escrupulosamente...

»Tranquilize-se, meu caro Edmond, aproximamo-nos do fim.

»Em 1807, um mês antes da minha prisão e quinze dias depois da morte do conde de Spada, em 25 de Dezembro - já vai compreender por que motivo esse dia memorável me ficou na memória -, relia pela milésima vez aqueles papéis, que arrumava, pois o palácio pertencia então a um estrangeiro e eu ia deixar Roma para me instalar em Florença, levando comigo uma dúzia de milhares de libras que possuía, a minha biblioteca e o meu famoso breviário, quando, cansado daquele estudo assíduo, mal disposto devido a um almoço bastante pesado que comera, deixei cair a cabeça nos braços e adormeci. Eram três horas da tarde.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069