O Conde de Monte Cristo - Cap. 52: Toxicologia Pág. 506 / 1080

- Está debaixo do castanheiro grande - continuou o endiabrado rapazinho, oferecendo, apesar dos gritos da mãe, moscas vivas ao papagaio, que parecia grande apreciador daquela espécie de caça.

A Sr.ª de Villefort estendia a mão para tocar e dizer à sua criada de quarto o sítio onde encontraria Valentine quando esta entrou. Parecia triste, com efeito, e observando-a atentamente poder-se-iam ver até nos seus olhos vestígios de lágrimas.

Valentine, que, levados pela rapidez da narrativa apresentámos aos leitores sem a dar a conhecer, era uma rapariga alta e esbelta, de dezanove anos, cabelo castanho-claro, olhos azuis-escuros e andar lânguido e com o cunho da requintada distinção que caracterizava a mãe. As suas mãos brancas e esguias, o seu colo nacarado e as suas faces matizadas de cores fugazes davam-lhe à primeira vista o ar de uma dessas belas inglesas que por vezes se comparam, bastante poeticamente, nas suas atitudes, a cisnes presunçosos.

Entrou e, vendo ao pé da madrasta o estrangeiro de quem tanto ouvira já falar, cumprimentou-o sem quaisquer trejeitos de adolescente e sem baixar os olhos, com uma graça que redobrou a atenção do conde.

Este levantou-se.

- Mademoiselle de Villefort, minha enteada - disse a Sr.ª de Villefort a Monte-Cristo, inclinando-se no sofá e mostrando com a mão Valentine.

- E o Sr. Conde de Monte-Cristo, rei da China e imperador da Cochinchina - acrescentou o jovem brincalhão, lançando um olhar velhaco à irmã.

Desta vez, a Sr.ª de Villefort empalideceu e esteve quase a perder a paciência com aquele flagelo doméstico chamado Edouard. Mas, muito pelo contrário do que esperava, o conde sorriu e pareceu olhar o fedelho com benevolência, o que levou ao cúmulo a alegria e o entusiasmo da mãe.

- Mas, minha senhora - disse o conde, reatando a conversa e olhando alternadamente para a Sr.ª de Villefort e para Valentine -, não tive já a honra de a ver em qualquer parte, à senhora e à menina? Ainda há pouco pensava nisso, e quando amenina entrou a sua pessoa foi mais uma luz projectada sobre uma recordação confusa, perdoe-me a palavra.

- Não é provável, senhor. Mademoiselle de Villefort aprecia pouco a sociedade e nós saímos raramente - respondeu a jovem senhora.

- Por isso não foi na sociedade que vi a menina, nem a senhora, e muito menos este encantador maganão. Aliás, a sociedade parisiense é-me absolutamente desconhecida, pois creio ter tido a honra de lhe dizer que me encontro em Paris apenas há dias. Não, se me permite que recorde... espere...

O conde pôs a mão na testa, como que para concentrar todas as suas recordações.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069