O Conde de Monte Cristo - Cap. 89: A Noite Pág. 851 / 1080

A pobre mulher deixou cair a cabeça entre as mãos; as pernas dobraram-se-lhe e caiu de joelhos.

- Perdoe, Edmond - suplicou. - Perdoe por mim, que ainda o amo!

A dignidade da esposa conteve o impulso da amante e da mãe. A sua fronte inclinou-se quase a tocar o tapete.

O conde correu para ela e levantou-a.

Então, sentada numa poltrona, pôde, através das lágrimas, olhar o rosto másculo de Monte-Cristo, no qual a dor e o ódio imprimiam ainda um carácter ameaçador.

- Que não esmague essa raça maldita! - murmurou ele. – Que desobedeça a Deus, que me escolheu para os punir! Impossível, minha senhora, impossível!

- Edmond - suplicou a pobre mãe, tentando tudo. - Meu Deus, se o trato por Edmond, porque me não trata por Mercédès?

- Mercédès - repetiu Monte-Cristo -, Mercédès... Sim, tem razão, ainda gosto de pronunciar esse nome e é a primeira vez há muito tempo que ele soa tão claramente ao sair-me dos lábios. Oh, Mercédès, pronunciei o seu nome com suspiros de melancolia, com gemidos de dor, com o estertor do desespero! Pronunciei-o gelado pelo frio, encolhido na palha da minha cela. Pronunciei-o devorado pelo calor, robolando-me nas lajes da minha prisão. Mercédès, tenho de me vingar, porque sofri durante catorze anos e catorze anos chorei e amaldiçoei.

»Agora, repito-lhe, Mercédès, tenho de me vingar!

E o conde, receando ceder às súplicas daquela que tanto amara, chamava as suas recordações em auxílio do seu ódio.

- Vingue-se, Edmond, mas vingue-se nos culpados! - gritou a pobre mãe. - Vingue-se nele, vingue-se em mim, mas não se vingue no meu filho!

- Está escrito no Livro Sagrado - respondeu Monte-Cristo que «os pecados dos pais recairão sobre os filhos até à terceira e quarta geração». Se Deus ditou estas palavras ao seu profeta, porque seria eu melhor do que Deus?

- Porque Deus possui o tempo e a eternidade, duas coisas que escapam aos homens.

Monte-Cristo soltou um suspiro que parecia um rugido e puxou os cabelos com ambas as mãos.

- Edmond - continuou Mercédès, com os braços estendidos para o conde - Edmond, desde que o conheci que adorei o seu nome e respeitei a sua memória. Edmond, meu amigo, não me obrigue a embaciar essa imagem nobre e pura reflectida constantemente no espelho do meu coração. Edmond, se soubesse todas as preces que tenho dirigido a Deus por si enquanto o esperei vivo e desde que o julguei morto... sim, morto, infelizmente! Julguei o seu cadáver sepultado no fundo de alguma torre sombria; julguei o seu corpo precipitado no fundo de algum desses abismos para onde os carcereiros deixam rolar os prisioneiros mortos e chorei!





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069