O Conde de Monte Cristo - Cap. 94: A confissão Pág. 890 / 1080

Recuou apavorado.

Quanto a Monte-Cristo, depois desta explosão fechou um momento os olhos, como que deslumbrado por relâmpagos interiores, e entretanto recolheu-se com tanta força que se viu acalmar pouco a pouco a agitação que lhe fazia ondular o peito repleto de tempestades, como depois da passagem da nuvem negra carregada de chuva o sol doura as vagas turbulentas e espumosas.

Aquele silêncio, aquele recolhimento, aquela luta duraram cerca de vinte segundos.

Depois o conde ergueu a fronte pálida.

- Veja - disse numa voz já quase normal -, veja, caro amigo, como Deus sabe castigar com a sua indiferença os homens mais fanfarrões e mais frios perante os espectáculos terríveis que lhes proporciona. Eu que assistia, impassível e curioso, ao desenrolar dessa lúgubre tragédia; eu que, como o anjo mau, ria do mal que os homens praticam em segredo (e o segredo é fácil de guardar aos ricos e aos poderosos), sinto-me por minha vez mordido por essa serpente cujo movimento tortuoso observava, e mordido no coração!

Morrel soltou um gemido abafado.

- Vamos, vamos, basta de queixumes - continuou o conde. – Seja homem, seja forte, tenha esperança, porque eu estou aqui e velo por si.

Morrel abanou tristemente a cabeça.

- Disse-lhe que tivesse esperança! Compreendeu? - impacientou-se Monte-Cristo. - Sabe muito bem que nunca minto, que nunca me engano. É meio-dia, Maximilien; dê graças a Deus por ter vindo ao meio-dia em vez de vir à noite, em vez de vir amanhã de manhã. Ouça o que lhe vou dizer, Morrel: é meio-dia; se Valentine não morreu até agora, não morrerá.

- Oh, meu Deus, meu Deus! - exclamou Morrel. - Mas se a deixei moribunda!

Monte-Cristo levou uma das mãos à testa. Que se passou naquela cabeça tão carregada de segredos horríveis? Que disse àquele espírito simultaneamente implacável e humano o anjo da luz ou o anjo das trevas? Só Deus o sabia!

Monte-Cristo levantou a cabeça mais uma vez, e desta vez estava tão calmo como uma criança ao acordar.

- Maximilien - disse -, volte tranquilamente para casa.

Recomendo-lhe que não dê um passo, que não tente nenhuma diligência, que não consinta que lhe tolde o rosto a sombra de uma preocupação. Dar-lhe-ei notícias. Vá.

- Meu Deus! Meu Deus! - exclamou Morrel. - O senhor assusta-me conde, com esse sangue-frio. Pode alguma coisa contra a morte? É mais do que um homem? É um anjo? É Deus?

E o jovem, que nenhum perigo fizera recuar um passo, recuava diante de Monte-Cristo, dominado por indizível terror.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069