O Conde de Monte Cristo - Cap. 14: O prisioneiro furioso e o prisioneiro louco Pág. 98 / 1080

Era, como se vê, um homem cheio de humanidade este inspector, e bem digno das funções filantrópicas que desempenhava.

- Tem razão, senhor - concordou o governador - e a sua reflexão prova que estudou profundamente a matéria. Também temos numa masmorra separada desta apenas um vintena de pés e para a qual se desce por outra escada um velho abade, antigo chefe de partido em Itália, está aqui desde 1811, endoideceu por volta de fins de 1813 e que desde esse momento não é fisicamente reconhecível. Dantes chorava, agora ri, emagrecia, engordou. Quer vê-lo em vez deste? A sua loucura é divertida e não o entristecerá nada.

- Verei um e outro - respondeu o inspector. - É necessário fazer as coisas conscienciosamente.

O inspector andava na sua primeira inspecção e queria dar boa ideia de si às autoridades.

- Vejamos portanto este em primeiro lugar - acrescentou.

- Como queira - respondeu o governador.

E fez sinal ao chaveiro, que abriu a porta.

Ao ouvir rangerem as fechaduras maciças e chiarem os gonzos ferrugentos ao girarem nos seus eixos, Dantès, que se encontrava agachado a um canto da masmorra onde recebia com indizível prazer o delgado raio de luz que se filtrava através de um estreito respiradouro gradeado, levantou a cabeça. Ao ver um homem desconhecido, iluminado por dois chaveiros que empunhavam archotes e ao qual o governador falava de chapéu na mão, acompanhado por dois soldados, Dantès adivinhou de quem se tratava e, vendo finalmente apresentar-se uma ocasião de implorar a uma autoridade superiora, saltou para a frente com as mãos juntas.

Os soldados cruzaram imediatamente as baionetas, pois julgaram que o prisioneiro avançava para o inspector com más intenções. O próprio inspector deu um passo atrás.

Dantès viu que o tinham apresentado como um homem temível. Então, reuniu no olhar tudo o que o coração do homem pode conter de mansidão e humildade e, exprimindo-se numa espécie de eloquência religiosa, que surpreendeu os assistentes, procurou comover a alma do visitante.

O inspector escutou o discurso de Dantès até ao fim. Depois, virando-se para o governador, disse a meia voz:

- Voltará à devoção; está já disposto a sentimentos mais suaves.

Como vê, o medo produz o seu efeito nele. Recuou diante das baionetas; ora, um louco não recua diante de nada. A tal respeito fiz observações muito curiosas em Charenton

Depois, virando-se para o prisioneiro:

- Em resumo, que pede?

- Peço me digam que crime cometi; peço que me dêem juízes; peço que o meu processo seja instruído; peço finalmente que me fuzilem se sou culpado ou que me ponham em liberdade se estou inocente.

- É bem alimentado? - perguntou o inspector.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069