- Então que é isso? - disse meigamente Joana, tocando-lhe nas mãos que ela enclavinhara amparando a fronte.
- E seu irmão? - disse Ângela, como se a pergunta saísse de um diálogo mental.
- Meu irmão? O quê, minha amiga?
- Não o hei de ver mais?
- Por que não, Sr.ª D. Ângela? Pois que razão há para que o não veja?
- Quando a felicidade do coração se tornou impossível...
- Impossível, não. Vossa excelência quis ser noutro tempo esposa de meu irmão. Quem sabe se um dia poderá mais livremente dispor da sua vontade!... Seu marido tem bastante idade...
- Eu era nesse tempo a mulher com o prestígio que se desfez... Esse homem, que me prendeu ao remorso e vergonha de me deixar vencer da compaixão e dos baixos pensamentos de ser rica, igualou-me a qualquer mulher vulgar... Se eu desmereci aos meus próprios olhos, autorizei todo o mundo a considerar-me aviltada...
- Não diga isso, minha senhora... - atalhou Joana, tomando-lhe as mãos cariciosamente. - Pois não vê nessas sinceras confissões de meu irmão como ele a amava?...
- Amava a saudade; não era a mulher; amava o passado e que lá se perdeu. À luz que então me via não poderá ver-me jamais. Eu hei de ser sempre a esposa ou a viúva dum homem que me lançou de si com desprezo... E, depois, a gratidão das almas nobres, como a de Francisco, pode levá-lo a dobrar-me o joelho com admiração: mas, com amor, nunca. Eu sei isto, adivinho isto. Se eu vendesse a casinha única onde me abrigasse para lhe melhorar a sorte dele, essa dedicação sublime duplicaria o meu direito a ser amada; mas eu, quando bem penso no que fiz, duvido que me louvem os estranhos, e sinto esfriar a veemência de gratidão naquele mesmo por amor de quem me pareceu louvável o ato que pratiquei.