Os Brilhantes do Brasileiro - Cap. 14: XIV - Via dolorosa Pág. 70 / 174

Esta madre era notável nas formas aforismáticas, e quase sempre rebatia as réplicas com argumento de dois bicos. Parece que, na convivência de varões doutos, a sutil religiosa medrava em espírito o que os mestres iam adelgaçando na parte que Xavier de Maistre denomina a outra.

Rita de Barrosas, escrevendo a D. Ângela, pedia-lhe que fosse estar com ela uma temporada à bela quinta que seu irmão acabava de comprar; e ajuntava que, sendo necessária licença, ela se encarregaria de a requerer e obter em Braga.

Ninguém impediu a saída da reclusa. As freiras cooperaram quase todas para que não se estorvasse à pobre senhora o intento de pedir perdão ao general.

Efetivamente, Ângela, apesar de desprezada do pai, insistia em tentar a reconciliação apresentando-se-lhe com as súplicas piedosas do costume. Se ela medisse o seu amor filial pelo que devia esperar de Simão de Noronha, poupar-se-ia a tentativas vãs. Em verdade, o desapego era recíproco. A ficção poderia espremer lágrimas dos olhos de Ângela aos pés do pai, que lhas desprezaria; se, todavia, ele pudesse sobreposse acariciá-la, os júbilos do perdão escassamente agitariam o coração da filha. Seriam, bem ensaiados, filha e pai de comédia, quando os artistas se compenetram dos seus papéis.

Um pensamento, nem esquisito, nem repreensível, avassalava o ânimo de Ângela: cogitava em ser rica para enriquecer Francisco da Costa e irmã. O amor já entrava quase esvaído neste cálculo. Figurava-se-lhe que tocaria o acume da fortuna se conseguisse pagar cem por um dos bens que perderam os dois irmãos, quebrado o esteio do lojista.

Ora, a riqueza donde lhe proviria a não ser do general, cuja abastança engrossara com a herança de D. Beatriz?

Rijo era, pois, o estímulo que a fazia transpor as balizas da dignidade.





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