O Mistério da Estrada de Sintra - Cap. 34: SEXTA PARTE - A CONFISSÃO DELA
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SEXTA PARTE - A CONFISSÃO DELA
CAPÍTULO I

Parece-me às vezes que tudo isto se passou numa vida distante como um romance escrito, que me causa saudades e dor, ou uma velha confidencia de que a minha alma se lembra. Mas de repente a realidade cai arrebatadamente sobre mim, e creio que sofro mais então, por ter a consciência de que não devia nunca ter deixado de sofrer. Foi bom que me determinasse a esta confissão. Contar uma dor é consola-la. Desde que me determinei a escrever estas confidências, há no meu peito um alivio e como um movimento de dores cruéis que desamparem os seus recantos.

O princípio das minhas desgraças foi em Paris. Lá comecei a morrer. Lembra-me o dia, a hora, a cor da relva, a cor do meu vestido. Foi no fim do penúltimo inverno, em maio. Ele estava também em Paris. Víamo-nos sempre. às vezes saíamos da cidade, íamos passar o dia a Fontainebleau, Vincenes, Bougival, para o campo. A primavera era serena e tépida. Já estavam floridos os lilases. Levávamos um cabazinho da India com fruta, num leito de folhas de alface. Riamos como noivos…

Havia três meses que estávamos em Paris: o conde - creio que o disse - estava na Escócia com lord Grenlei caçando a raposa nas tapadas do príncipe de Beaufort.

Houve então um baile no Hotel de Vile, um desses bailes oficiais em que uma multidão de praça pública se acotovela sob os lustres, brutalmente. Tinha eu acabado de dançar uma valsa com um coronel austríaco, quando a viscondessa de L…, que vivia então em Paris, veio a mim, toda risonha:

- Conheces este nome: miss Shorn?

- Não. Uma americana?

- Uma irlandesa. Uma maravilha, O prefeito dançou com ela; a condessa Waleuska beijou-a na testa, Gustavo Doré prometeu-lhe um desenho. vai ser apresentada nas Tulherias.





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