CAPÍTULO VI Ao outro dia eu devia encontrar-me com ele nessa fatal casa n.º… Fui, como sempre, toda vestida de preto, envolta num grande véu. Estava extremamente pálida, palpitava-me o coração de susto. Era aquele um momento de transe. Eu decidira ter com Ritmel uma explicação clara, definitiva, sem equívocos… Uma palavra que ele dissesse, seca ou indiferente, um gesto impaciente, e eu considerar-me-ia como abandonada, exilada da vida; retirava-me para um chalet da Suíça, ou para Jerusalém, ou para a melancolia de um claustro no sul da França. Tinha determinado assim a solução do meu destino.
Quando cheguei à casa n.º… ele não estava ainda. Fiquei ali muito tempo, imóvel numa cadeira. Os ruídos da rua chegavam-me como no fundo de um sonho. A sala tinha uma luz esbatida, através dos vidros foscos como os globos dos candeeiros. Eu sentia aquela impressão indefinida, que nos vem quando estamos durante muito tempo num lugar sossegado e triste, olhando o silencioso cair da chuva.
De repente a porta gemeu docemente, ele entrou.
Vinha do campo. Tinha colhido para mim um pequenino ramo de flores miúdas das sebes. Veio apoiar-se nas costas da minha cadeira, e deixou-mas cair no regaço…
Depois, falando-me baixo, junto da face:
- Andei todo o dia a pensar em si, à travers champs.
Não respondi, e com os olhos errantes nas cores do tapete, desfolhei cruelmente as pequeninas flores dos prados. Tinha um contentamento amargo em torturar aqueles delicados seres, que vinham dele, e que me parecia terem dele aprendido a mentir.
- Pensei constantemente em si, e o passeio foi encantador, repetiu com uma voz docemente insistente.
Eu ergui os olhos para ele.
- Responda-me: sabe mentir?
- Mas, meu Deus, disse ele, afastando-se, parece que me quer hoje mal, minha querida filha!
Não respondi; mas o meu regaço estava coberto de flores mutiladas.