SÉTIMA PARTE - CONCLUEM AS REVELAÇÕES DE A. M. C.
CAPÍTULO I Convidada a expor o que sabia, a condessa disse de viva voz, com humildade e com firmeza, a causa e o modo como involuntariamente matara Ritmel.
- Eis as cartas e as notas que ele trazia consigo - concluiu ela, colocando sobre a mesa um maço de papéis atados numa gravata branca. As minhas derradeiras disposições, acrescentou, estão feitas. Dêem-me o destino que quiserem. Inflijam-me o castigo que mereço.
Estávamos todos calados. F… adiantou-se para o centro da sala e ergueu a voz:
- Castigar é usurpar um poder providencial. A justiça humana que se apodera dos criminosos não tem por fim vingar a sociedade, mas sim protege-la do contágio e da infeção da culpa. Todo o crime é uma enfermidade. A ação dos tribunais sobre os criminosos, posto que nem sempre cesse de fato, cessa efetivamente de direito no momento em que termina a cura. Sequestrar aqueles em que o mal deixou de ser uma suspeita fisiológica, e por conseguinte uma verdade cientifica, é fazer à sociedade uma extorsão, que, por ser muitas vezes irremediável não deixa de ser monstruosa e horrível. Todo aquele que não é pernicioso, é necessário, é indispensável ao conjunto dos sentimentos, ao destino das ideias, à aritmética dos fatos no problema da humanidade. A natureza do ato que estamos ponderando, as rasões que o determinaram, as circunstâncias que o revestiram, a intenção que lhe deu origem, tudo isto nos convence de que a liberdade desta senhora não pode constituir um perigo. Encarcerada e entregue à ação dos tribunais, seria uma causa-crime, interessante, escandalosa, prejudicial. Restituída a si mesma, será um exemplo, uma lição.
E aproximando-se da porta, correu a chave que a fechava por dentro, abriu-a de par em par, e dirigindo-se à condessa, com voz respeitosa e grave, acrescentou:
- Vá, minha senhora: tem a mais plena liberdade.