CAPÍTULO III A cama do alemão tinha ficado, como disse, por baixo do meu buraco de observação. O meu vizinho deitou-se e soprou a vela. O quarto ficou às escuras, e eu senti os colchões que rangiam com o peso do corpo que se ajeitava para dormir.
- Ah! tua amas o murmúrio dos espíritos invisíveis?… exclamei eu, dirigindo-me mentalmente ao filósofo que me ficava do outro lado do muro. Aprazem-te as ondulações sonoras das moléculas da vida animal que vagueiam dispersas no espaço, procurando o sopro misterioso que as condense para entrarem na corrente dos seres vivos? Queres encadear ao teu espírito esses elos informes e incoercíveis, que ligam o mundo das coisas conhecidas ao mundo dos seres ignotos? Ora vamos lá a ver como tu empregas as tuas faculdades de médium…
E pensando isto, bati-lhe com os nós dos dedos na parede três pancadinhas secas, metodicamente espaçadas, como as dos sinais maçónicos.
Senti roçar a mão dele pelo papel que forrava o muro, como quem procurasse apalpar algum sinal do rumor que ouvira.
Entrei então a repetir com sucessiva frequência o rebate que lhe dera percorrendo diferentes pontos da parede que servia de fundo ao armário.
Percebi que ele se sentava na cama. Ouvi estalar um fosforo. Acendeu-se a luz. Parei. Houve uma pausa, durante a qual me conservei silencioso e imóvel. O meu vizinho apagou finalmente a luz ao cabo de alguns minutos, e eu recomecei a bater devagarinho e repetidamente como primeiro fizera. Ele, tendo escutado por algum tempo às escuras, acendeu outra vez a vela e começou a examinar o espaço da parede, junto da qual lhe ficava a cama.
No momento em que a chama da vela perpassava na mão dele por em frente do meu buraco, soprei-lhe de repente e apaguei a luz.
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