Não pense que digo isto com amargura. A maior alegria que eu posso ter é a aniquilação da minha individualidade.
Por isso não tenho escrúpulos. As almas extremamente desgraçadas são como as criancinhas: devem mostrar-se nuas.
Além de tudo suponho que estas páginas podem ser uma revelação proveitosa para aquelas que estejam nas ilusões da paixão. Que me escutem pois!
São 11 horas da noite. Neste momento quantas sei eu que sofrem, que esperam, que mentem, possuídas de um sentimento, que pouco mais lhes dá do que a felicidade de serem desgraçadas! Tu, minha pobre J…, mulher de discretos martírios, a quem tantas vezes vi os olhos pisados das lágrimas! tu pobre t…, que tens passado a tua vida a tremer, a recear, a humilhar-te, a espreitar, e a fugir…, vós todas que estais envolvidas pelo elemento cruel da paixão, quase fora da vida, e em luta com a verdade humana, vós todas escutai-me!
Desde que amei, a minha vida foi um desequilíbrio perpétuo. Não era voluntariamente que eu cedia à atracão, era com uma repugnância altiva. Mil coisas choravam dentro em mim, sofria sobretudo o orgulho. Era impossível fazer com ele uma conciliação. Reagiu sempre, protesta ainda. Parece vencido, resignado, mas de repente ergue-se dentro de mim, esbofeteia-me o coração.
O que eu sofri! o que eu corei! Corei diante da minha pobre Joana, da minha velha ama, um anjo cheio de rugas, que sabe sobretudo amar quando tem de perdoar! Corava diante das minhas criadas. Julgava-me feliz quando elas me sorriam, tremia quando lhes via o aspeto serio. Dava-lhes vestidos, ensinava-lhes penteados. Saíam às vezes de tarde, recolhiam alta noite; eu corava profundamente no meu coração, e sorria-lhes.
O olhar dos homens era-me insuportável: parecia-me envolver uma afronta.