Hoje, mais sossegado e sereno, posso contar-lhe com precisão e realidade, reconstruindo-o do modo mais nítido, nos diálogos e nos olhares, o que se seguiu à entrada imprevista daquela pessoa no quarto onde estava o morto.
O homem tinha ficado estendido no chão, sem sentidos: molhámos-lhe a testa, demos-lhe a respirar vinagre de toilete. Voltou a si, e, ainda trêmulo e pálido, o seu primeiro movimento instintivo foi correr para a janela!
O mascarado, porém, tinha-o envolvido fortemente com os braços, e arremessou-o com violência para cima de uma cadeira, ao fundo do quarto. Tirou do seio um punhal, e disse-lhe com voz fria e firme:
- Se faz um gesto, se dá um grito, se tem um movimento, varo- lhe o coração!
- Vá, vá, disse eu, breve! responda… Que quer? Que veio fazer aqui?
Ele não respondia, e com a cabeça tomada entre as mãos, repetia maquinalmente:
- Está perdido tudo! Está tudo perdido!
- Fale, disse-lhe o mascarado, tomando-lhe rudemente o braço, que veio fazer aqui? Que é isto? como soube?…
A sua agitação era extrema: luziam-lhe os olhos entre o cetim negro da mascara.
- Que veio fazer aqui? repetiu agarrando-o pelos ombros e sacudindo-o como um vime.
- Escute… disse o homem convulsivamente. Vinha saber… disseram-me… Não sei. Parece que já cá estava a polícia… queria… saber a verdade, indagar quem o tinha assassinado… vinha tomar informações…
- Sabe tudo! disse o mascarado, aterrado, deixando pender os braços.
Eu estava surpreendido; aquele homem conhecia o crime, sabia que havia ali um cadáver! Só ele o sabia, porque deviam ser decerto absolutamente ignorados aqueles sucessos lúgubres. Por consequência quem sabia onde estava o cadáver, quem tinha uma chave da casa, quem vinha alta noite ao lugar do assassinato, quem tinha desmaiado vendo-se surpreendido, estava positivamente envolvido no crime…
- Quem lhe deu a chave? perguntou o mascarado.