O Conde de Monte Cristo - Cap. 83: A mão de Deus Pág. 804 / 1080

Segunda fortuna desce para ti do céu, recuperas ao mesmo tempo o dinheiro e a tranquilidade, podes recomeçar a viver a vida de todos os homens, tu que foras condenado a viver a dos forçados. Então, miserável, então atreves-te a tentar Deus pela terceira vez. «Não tenho o suficiente», dizes tu, quando tinhas mais do que alguma vez tiveras, e cometes terceiro crime, sem razão, sem desculpa. Deus cansou-se, Deus castigou-te.

Caderousse enfraquecia a olhos vistos.

- Quero beber... tenho sede... ardo! - balbuciou.

Monte-Cristo deu-lhe um copo de água.

- Esse celerado do Benedetto - disse Caderousse, restituindo o copo - escapará, apesar de tudo...

- Ninguém escapará, sou eu que to digo, Caderousse... Benedetto será castigado!

- Então também o senhor será castigado - redarguiu Caderousse -, porque não cumpriu o seu dever de padre... Devia impedir Benedetto de me matar.

- Eu - disse o conde com um sorriso que gelou de terror o moribundo -, eu impedir Benedetto de te matar quando acabavas de quebrar a tua navalha contra a cota de malha que me cobria o peito?... Sim, talvez se te tivesse encontrado humilde e arrependido tivesse impedido Benedetto de te matar; mas encontrei-te orgulhoso e sanguinário e deixei cumprir-se a vontade de Deus!

- Não acredito em Deus! - bramiu Caderousse. - E tu também não. Tu mentes... mentes!

- Cala-te, se não queres lançar fora do teu corpo as tuas últimas gotas de sangue... - aconselhou o abade. - Ah, não acreditas em Deus, mas morres ferido por Deus!... Ah, não acreditas em Deus e no entanto Deus só pede uma prece, uma palavra, uma lágrima para perdoar!... Deus, que poderia dirigir o punhal do assassino de maneira que expirasses imediatamente... Deus concedeu-te um quarto de hora para te arrependeres... Recolhe-te, pois, em ti mesmo, desgraçado, e arrepende-te!

- Não, não me arrependo - teimou Caderousse. - Não existe Deus, não existe Providência, só existe o acaso.

- Existe uma Providência e existe um Deus - replicou Monte-Cristo -, e a prova é que enquanto estás aí deitado, desesperado, renegando Deus, eu estou aqui de pé diante de ti, rico, feliz, são e salvo, de mãos postas diante desse Deus em que tentas não acreditar, mas em que mesmo assim acreditas no fundo do coração.

- Mas então quem é o senhor? - perguntou Caderousse, fixando os seus olhos de moribundo no conde.

- Olha-me bem - disse Monte-Cristo, pegando aproximando-a da cara.

- Bom, é o abade... o abade Busoni...

Monte-Cristo tirou a peruca que o desfigurava e deixou cair os seus belos cabelos negros que emolduravam tão harmoniosamente o seu rosto pálido.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069