O Conde de Monte Cristo - Cap. 100: A aparição Pág. 939 / 1080

Nesse momento, um reflexo da lamparina iluminou o rosto do visitante nocturno.

- Não é ele!... - murmurou a jovem.

E esperou, convencida de que sonhava, que aquele homem, como acontece nos sonhos, desaparecesse ou se transformasse em qualquer outra pessoa.

Entretanto, apalpou o pulso e, sentindo-o bater violentamente, lembrou-se de que o melhor meio de fazer desaparecer aquelas visões importunas era beber: a frescura da bebida, preparada de resto para acalmar as agitações de que Valentine se queixara ao médico, contribuía, fazendo baixar a febre, para renovar as sensações do cérebro. Depois de beber, sofria menos durante algum tempo.

Valentine estende pois a mão, a fim de pegar no copo do pires de cristal onde se encontrava. Mas no momento em que estendia fora da cama o braço trémulo, a aparição deu novamente, com mais rapidez do que nunca, dois passos para a cama e chegou tão perto da jovem que esta ouviu-lhe a respiração e julgou sentir-lhe a pressão da mão.

Desta vez a ilusão, ou antes a realidade, ultrapassava tudo o que Valentine experimentara até ali; começou a considerar-se bem acordada e viva; teve consciência de se encontrar de posse de toda a sua razão e estremeceu.

A pressão que Valentine sentira destinava-se a deter-lhe o braço.

Valentine retirou-o lentamente para si.

Então a figura, da qual não conseguia despregar os olhos, e que, de resto, parecia mais protectora do que ameaçadora, essa figura pegou no copo, aproximou-se da lamparina e observou a beberagem, como se quisesse apreciar-lhe a transparência e a limpidez.

Mas esta primeira prova não bastou.

O homem, ou antes o fantasma - porque andava tão suavemente que o tapete abafava o ruído dos seus passos -, tirou do copo uma colher da beberagem e engoliu-a. Valentine observava o que se passava diante dos seus olhos com profundo espanto.

Estava convencidíssima de que tudo aquilo não tardaria a desaparecer para dar lugar a outro quadro; mas o homem, em vez de se sumir como uma sombra, voltou a aproximar-se, estendeu o copo a Valentine e disse-lhe numa voz cheia de emoção:

- Agora, beba!...

Valentine estremeceu.

Era a primeira vez que uma das suas visões lhe falava naquele timbre vibrante.

Abriu a boca para gritar.

O homem pôs-lhe um dedo nos lábios.

- O Sr. Conde de Monte-Cristo!... - murmurou ela.

Pelo terror que transpareceu dos olhos da jovem, pela tremura das suas mãos e pelo gesto rápido que esboçou para se esconder debaixo dos lençóis, podia-se reconhecer a última luta da dúvida contra a convicção, de facto, a presença de Monte-Cristo no seu quarto a semelhante hora e a sua entrada misteriosa, fantástica, inexplicável, por uma parede, pareciam coisas impossíveis à razão abalada de Valentine.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069